06/10/2025

O ITBI à luz do art. 156, II, § 2º da CF, do CTN atual e das mudanças propostas pela PLP 108-B.

 



1. Enquadramento constitucional do ITBI

O art. 156, II da Constituição Federal atribui aos Municípios a competência para instituir o Imposto sobre a Transmissão Inter Vivos, a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como a cessão de direitos à sua aquisição.

O § 2º do mesmo artigo determina que:

    A lei complementar poderá regular o modo como o imposto será cobrado quando o adquirente for pessoa jurídica e a operação envolver integração de capital, fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica.

    Também assegura que o imposto não incidirá sobre determinadas transmissões (as referidas no art. 156, § 2º, I da CF), desde que não haja atividade preponderantemente imobiliária.

Em suma, a Constituição define três pilares estruturantes do ITBI:

1.   Competência municipal exclusiva;

2.   Fato gerador oneroso (inter vivos);

3.   Necessidade de lei complementar nacional para uniformizar normas gerais.

2. Estrutura do CTN vigente (arts. 35 a 42)

O CTN, recepcionado como lei complementar pela CF/88, cumpre a função de disciplinar essas normas gerais. Ele define:

    Fato gerador (art. 35): transmissão da propriedade, domínio útil ou direitos reais (exceto garantia).

    Exclusões e isenções (arts. 36 e 37): operações societárias (fusão, incorporação, cisão) e integralizações de capital, salvo se houver atividade preponderantemente imobiliária.

    Base de cálculo (art. 38): valor venal do bem transmitido.

    Limite de alíquota (art. 39): fixado por resolução do Senado.

    Competência (art. 41): município da situação do imóvel.

    Contribuinte (art. 42): qualquer das partes, conforme dispuser a lei local.

O procedimento atual decorre dessas normas e é, na prática, disperso e heterogêneo:

    Cada município define como apurar o “valor venal”, geralmente usando o valor venal do IPTU.

    A cobrança do imposto é exigida como pré-condição para registro imobiliário, embora o CTN não preveja antecipação.

    Há assimetria de critérios, controvérsias sobre momento do fato gerador e multiplicidade de metodologias de avaliação.

3. Propostas do PLP 108-B e alinhamento constitucional

O PLP 108-B vem justamente cumprir o papel constitucional do art. 156, § 2º: modernizar e uniformizar normas gerais do ITBI, hoje desatualizadas.

As principais inovações são:

3.1. Reforço do caráter “oneroso”

O texto explicita que o ITBI incide sobre atos onerosos inter vivos, reforçando a diferenciação com o ITCMD.
 👉 Efeito constitucional: consolida a conformidade ao caput do art. 156, II.

3.2. Previsão expressa de antecipação do pagamento

Inclui artigo permitindo ao Município ou DF instituir antecipação facultativa do pagamento do ITBI no momento da formalização do título (lavratura da escritura pública), com alíquota diferenciada (reduzida) para quem optar pela antecipação.
 👉 Efeito constitucional: concretiza a faculdade do Município disciplinar o modo de cobrança (art. 156, § 2º), mas dentro das balizas de norma geral definida em lei complementar.

3.3. Redefinição técnica da base de cálculo

Substitui o atual “valor venal” genérico por valor venal de mercado, definido como valor pelo qual o imóvel seria negociado à vista em condições normais, estimado com critérios técnicos de avaliação (dados imobiliários, registros, características do bem, etc.).
 👉 Efeito constitucional: cumpre a função de norma geral prevista no art. 146, III, a e no art. 156, § 2º, unificando parâmetros de cálculo em todo o território nacional.

3.4. Revogação da limitação de alíquotas pelo Senado

O PLP revoga o art. 39 do CTN, transferindo aos municípios autonomia plena para fixar suas alíquotas.
 👉 Efeito constitucional: reforça o princípio da autonomia municipal (art. 18 e art. 156 da CF), mas elimina o controle nacional de patamares máximos.

4. Comparativo procedimental

Etapa / Aspecto

Procedimento Atual (CTN vigente)

Procedimento Proposto (PLP 108-B)

Momento da incidência

Ocorrência do fato gerador (registro da transmissão).

Mantido, mas o Município pode prever antecipação facultativa no ato da escritura.

Base de cálculo

“Valor venal” – usualmente o valor do IPTU (sem definição legal de método).

“Valor venal de mercado” com critérios técnicos e possibilidade de contestação.

Alíquota

Limitada por resolução do Senado.

Livre definição municipal.

Isenções e exclusões

Mesmas hipóteses (integração de capital, fusão, cisão, etc.)

Mantidas, sem alteração substancial.

Competência

Município da situação do imóvel.

Idêntico.

Contribuinte

Qualquer das partes, a critério da lei local.

Mantido.

 

5. Para os Municípios

    Aumento de autonomia tributária (definição de alíquotas e possibilidade de incentivo por antecipação).

    Maior previsibilidade arrecadatória, com fluxo de caixa antecipado;

    Necessidade de aparelhamento técnico para avaliação imobiliária, neste caso, os municípios terão as ferramentas do Cadastro Imobiliário Brasileiro (CIB) e do Sistema Nacional de Gestão de Informações Territoriais (SINTER).

6. Para os Contribuintes

    Definição clara e técnica de “valor venal de mercado”, com direito à avaliação contraditória.

    Transparência e previsibilidade nos critérios de cálculo.

    Possibilidade de pagar com alíquota reduzida, se optar pela antecipação.

7. Conclusão

A proposta do PLP 108-B consolida as normas gerais do ITBI e reequilibra o pacto federativo tributário ao alinhar o Código Tributário Nacional à Constituição Federal. A inclusão da possibilidade de antecipação do pagamento e a definição técnica da base de cálculo trazem racionalidade e transparência, enquanto a revogação do teto de alíquotas transfere maior poder de gestão aos municípios.

O novo modelo representa avanço no ponto de vista da autonomia e da coerência normativa, mas impõe desafios: o risco de desigualdade fiscal entre entes locais e o aumento do custo administrativo na avaliação técnica relativamente ao valor venal de mercado.

Para os contribuintes, a principal conquista é a clareza conceitual e o direito de contestação; a principal preocupação, o potencial de aumento da carga tributária e de desembolso antecipado.

Em síntese, o PLP 108-B moderniza o ITBI, alinhando-se ao art. 156, § 2º da Constituição no que tange à harmonização nacional de suas normas gerais. O desafio agora será garantir que a autonomia municipal não se converta em assimetria tributária, mas em instrumento legítimo de justiça fiscal e eficiência arrecadatória.

O PLP 108-B retorna à Câmara dos Deputados e após análise das emendas propostas pelo Senado, em seguida o Congresso se reúne para a aprovação do projeto de lei, e posteriormente ser enviado para sanção presidencial. 

 


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