O Plenário
do Supremo Tribunal Federal (STF) concluiu na sessão desta quarta-feira (24) o
julgamento conjunto de cinco processos que questionavam dispositivos da Lei
Complementar (LC) 105/2001, que permitem à Receita Federal receber dados
bancários de contribuintes fornecidos diretamente pelos bancos, sem prévia
autorização judicial. Por maioria de votos 9 a 2, prevaleceu o entendimento de
que a norma não resulta em quebra de sigilo bancário, mas sim em transferência
de sigilo da órbita bancária para a fiscal, ambas protegidas contra o
acesso de terceiros. A transferência de informações é feita dos bancos ao
Fisco, que tem o dever de preservar o sigilo dos dados, portanto não há ofensa
à Constituição Federal.
Na semana passada, foram
proferidos seis votos pela constitucionalidade da lei, e um em sentido
contrário, prolatado pelo ministro Marco Aurélio. Na decisão, foi enfatizados
que estados e municípios devem estabelecer em regulamento, assim como fez a
União no Decreto 3.724/2001, a necessidade de haver processo administrativo
instaurado para a obtenção das informações bancárias dos contribuintes,
devendo-se adotar sistemas certificados de segurança e registro de acesso do
agente público para evitar a manipulação indevida dos dados e desvio de finalidade,
garantindo-se ao contribuinte a prévia notificação de abertura do processo e
amplo acesso aos autos, inclusive com possibilidade de obter cópia das peças.
Na sessão desta tarde, o
ministro Luiz Fux proferiu o sétimo voto pela constitucionalidade da norma. O
ministro somou-se às preocupações apresentadas pelo ministro Luís Roberto
Barroso quanto às providências a serem adotadas por estados e municípios para a
salvaguarda dos direitos dos contribuintes. O ministro Gilmar Mendes também
acompanhou a maioria, mas proferiu voto apenas no Recurso Extraordinário (RE)
601314, de relatoria do ministro Edson Fachin, uma vez que estava impedido de
participar do julgamento das quatro Ações Diretas de Inconstitucionalidade –
ADIs 2390, 2386, 2397 e 2859 – em decorrência de sua atuação como
advogado-geral da União.
O ministro afirmou que os
instrumentos previstos na lei impugnada conferem efetividade ao dever geral de
pagar impostos, não sendo medidas isoladas no contexto da autuação fazendária,
que tem poderes e prerrogativas específicas para fazer valer esse dever. Gilmar
Mendes lembrou que a inspeção de bagagens em aeroportos não é contestada,
embora seja um procedimento bastante invasivo, mas é medida necessária e
indispensável para que as autoridades alfandegárias possam fiscalizar e cobrar
tributos.
O decano do STF, ministro
Celso de Mello, acompanhou a divergência aberta na semana passada pelo ministro
Marco Aurélio, votando pela indispensabilidade de ordem judicial para que a
Receita Federal tenha acesso aos dados bancários dos contribuintes. Para ele,
embora o direito fundamental à intimidade e à privacidade não tenha caráter
absoluto, isso não significa que possa ser desrespeitado por qualquer órgão do
Estado. Nesse contexto, em sua opinião, o sigilo bancário não está sujeito a
intervenções estatais e a intrusões do poder público destituída de base
jurídica idônea.
“A administração
tributária, embora podendo muito, não pode tudo”, asseverou. O decano
afirmou que a quebra de sigilo deve se submeter ao postulado da reserva de
jurisdição, só podendo ser decretada pelo Poder Judiciário, que é terceiro
desinteressado, devendo sempre ser concedida em caráter de absoluta
excepcionalidade. “Não faz sentido que uma das partes diretamente
envolvida na relação litigiosa seja o órgão competente para solucionar essa
litigiosidade”, afirmou.
O presidente do STF,
ministro Ricardo Lewandowski, último a votar na sessão desta quarta, modificou
o entendimento que havia adotado em 2010, no julgamento do RE 389808, quando a
Corte entendeu que o acesso ao sigilo bancário dependia de prévia autorização
judicial. “Tendo em conta os intensos, sólidos e profundos debates que
ocorreram nas três sessões em que a matéria foi debatida, me convenci de que
estava na senda errada, não apenas pelos argumentos veiculados por aqueles que
adotaram a posição vencedora, mas, sobretudo porque, de lá pra cá, o mundo
evoluiu e ficou evidenciada a efetiva necessidade de repressão aos crimes como
narcotráfico, lavagem de dinheiro e terrorismo, delitos que exigem uma ação
mais eficaz do Estado, que precisa ter instrumentos para acessar o sigilo para
evitar ações ilícitas”, afirmou.
O relator das ADIs,
ministro Dias Toffoli, adotou observações dos demais ministros para explicitar
o entendimento da Corte sobre a aplicação da lei: “Os estados e municípios
somente poderão obter as informações previstas no artigo 6º da LC 105/2001, uma
vez regulamentada a matéria, de forma análoga ao Decreto Federal 3.724/2001,
tal regulamentação deve conter as seguintes garantias: pertinência
temática entre a obtenção das informações bancárias e o tributo objeto de
cobrança no procedimento administrativo instaurado; a prévia notificação
do contribuinte quanto a instauração do processo e a todos os demais
atos; sujeição do pedido de acesso a um superior
hierárquico; existência de sistemas eletrônicos de segurança que sejam
certificados e com registro de acesso; estabelecimento de instrumentos
efetivos de apuração e correção de desvios.”
Acesse,
também, os comentários contidos na matéria veiculada neste espaço intitulada “STF
– Temas Tributários – Plenário – 17/02/2016”, publicado em 10/02/2016.
Fonte: STF Notícias