A Segunda
Turma do STJ – Superior Tribunal de Justiça, por maioria de votos, deu
provimento ao REsp nº 1.246.317-MG (2011/0066819-3) de relatoria do Ministro
Mauro Campbell Marques ficando vencido o voto-vista do Ministro Herman Bejamin
publicado em 29/06/2015 tendo como recorrente a empresa Domingos Costa
Industria Alimentícia S/A e recorrida a Fazenda Nacional; cujo enunciado da
Ementa foi assim redigido:
EMENTA
PROCESSUAL CIVIL.
TRIBUTÁRIO. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO ART. 535, DO CPC. VIOLAÇÃO AO ART.
538, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CPC. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N. 98⁄STJ.
CONTRIBUIÇÕES AO PIS⁄PASEP E COFINS NÃO-CUMULATIVAS.
CREDITAMENTO. CONCEITO DE INSUMOS. ART. 3º, II, DA LEI N. 10.637⁄2002 E
ART. 3º, II, DA LEI N. 10.833⁄2003. ILEGALIDADE DAS
INSTRUÇÕES NORMATIVAS SRF N. 247⁄2002 E 404⁄2004.
1. Não viola o
art. 535, do CPC, o acórdão que decide de forma
suficientemente fundamentada a lide, muito embora não faça considerações
sobre todas as teses jurídicas e artigos de lei invocados pelas partes.
2. Agride o art.
538, parágrafo único, do CPC, o acórdão que aplica multa a embargos de
declaração interpostos notadamente com o propósito de prequestionamento.
Súmula n. 98⁄STJ: "Embargos de declaração manifestados com notório
propósito de prequestionamento não têm caráter protelatório".
3. São ilegais o art.
66, §5º, I, "a" e "b", da Instrução Normativa SRF n.
247⁄2002 - Pis⁄Pasep (alterada pela Instrução Normativa SRF n. 358⁄2003) e
o art. 8º, §4º, I, "a" e "b", da Instrução Normativa
SRF n. 404⁄2004 - Cofins, que restringiram indevidamente o conceito de
"insumos" previsto no art. 3º, II, das Leis n. 10.637⁄2002 e n.
10.833⁄2003, respectivamente, para efeitos de creditamento na sistemática
de não-cumulatividade das ditas contribuições.
4. Conforme
interpretação teleológica e sistemática do ordenamento jurídico em vigor,
a conceituação de "insumos", para efeitos do art. 3º, II, da Lei
n. 10.637⁄2002, e art. 3º, II, da Lei n. 10.833⁄2003, não se identifica
com a conceituação adotada na legislação do Imposto sobre Produtos
Industrializados - IPI, posto que excessivamente restritiva. Do mesmo
modo, não corresponde exatamente aos conceitos de "Custos e Despesas
Operacionais" utilizados na legislação do Imposto de Renda - IR, por
que demasiadamente elastecidos.
5. São
"insumos", para efeitos do art. 3º, II, da Lei n. 10.637⁄2002, e art.
3º, II, da Lei n. 10.833⁄2003, todos aqueles bens e serviços
pertinentes ao, ou que viabilizam o processo
produtivo e a prestação de serviços, que neles
possam ser direta ou indiretamente empregados e cuja subtração importa
na impossibilidade mesma da prestação do serviço ou da produção, isto é,
cuja subtração obsta a atividade da empresa, ou implica em substancial
perda de qualidade do produto ou serviço daí resultantes.
6. Hipótese em que
a recorrente é empresa fabricante de gêneros alimentícios sujeita,
portanto, a rígidas normas de higiene e limpeza. No ramo a que
pertence, as exigências de condições sanitárias das instalações se não
atendidas implicam na própria impossibilidade da produção e em substancial
perda de qualidade do produto resultante. A assepsia é essencial e
imprescindível ao desenvolvimento de suas atividades. Não houvesse os
efeitos desinfetantes, haveria a proliferação de micro-organismos na
maquinaria e no ambiente produtivo que agiriam sobre os alimentos,
tornando-os impróprios para o consumo. Assim, impõe-se
considerar a abrangência do termo "insumo" para contemplar, no
creditamento, os materiais de limpeza e desinfecção, bem como os serviços
de dedetização quando aplicados no ambiente produtivo de
empresa fabricante de gêneros alimentícios.
7. Recurso
especial provido.
Oportuno se faz a reprodução do voto
vencedor do ministro relator relativamente ao cerne da questão guerreada com o
intuito de melhor compreensão do alcance do julgado ao caso concreto.
Vejamos.
VOTO
O EXMO. SR. MINISTRO
MAURO CAMPBELL MARQUES (Relator): Com efeito, o PARTICULAR
interpôs recurso especial fundado na ofensa aos arts. 3º das leis
ns. 10.637⁄2002 e 10.833⁄2003, além do art. 100, I, do CTN, sob o
argumento de que as Instruções Normativas ns. 247⁄2002, 358⁄2003 e 404⁄2004
teriam desrespeitado o alcance das leis regulamentadas ao limitar o
significado do termo "insumo" previsto nos artigos
das referidas leis ordinárias. Há correspondência lógica entre os
argumentos desenvolvidos, o acórdão proferido e o intuito pretendido, de
forma que inaplicável o enunciado n. 284, da Súmula do STF.
(...)
3. Mérito: da
legislação tributária sob exame.
O cerne da
controvérsia diz respeito ao reconhecimento do direito do
recorrente, fabricante de produtos alimentícios, de ver assegurado o
aproveitamento de créditos provenientes de gastos com materiais de
limpeza, desinfecção e serviços de dedetização usados no ambiente produtivo,
com base nas Leis ns. 10.637⁄2002 e 10.833⁄2003.
Diz a Secretaria da
Receita Federal que: a) os gastos com materiais⁄bens de desinfecção
(limpeza) não dão direito aos créditos, porque não se consomem em função
da ação diretamente exercida sobre o produto em fabricação; e b) os
serviços de dedetização não dão direito ao crédito porque não correspondem
ao conceito de serviços aplicados ou consumidos na produção ou fabricação
do produto. Contra tais conclusões se insurgiu o contribuinte.
Em 29 de agosto de
2002, editou-se a Medida Provisória n. 66, que alterou a sistemática
do Pis e Pasep para instituir a não-cumulatividade dessas
contribuições, o que foi reproduzido pela Lei n. 10.637, de 30 de
dezembro de 2002 (lei de conversão), que, em seu art. 3º, inciso
II, autorizou a apropriação de créditos calculados em relação a bens e serviços utilizados
como insumos na fabricação de produtos destinados à venda. É a seguinte
a redação do referido dispositivo:
Art. 3o Do
valor apurado na forma do art. 2o a pessoa jurídica
poderá descontar créditos calculados em relação a:
[...]
II - bens e
serviços, utilizados como insumo na
prestação de serviços e na produção ou fabricação de bens
ou produtos destinados à venda, inclusive combustíveis e lubrificantes,
exceto em relação ao pagamento de que trata o art. 2o da
Lei no 10.485, de 3 de julho de 2002, devido pelo
fabricante ou importador, ao concessionário, pela intermediação ou entrega
dos veículos classificados nas posições 87.03 e 87.04 da TIPI;
Da mesma forma, a
Medida Provisória n. 135, de 30 de outubro de 2003, convertida na Lei
10.833, de 29 de dezembro de 2003, instituiu a sistemática da
não-cumulatividade em relação à apuração da Cofins, destacando
o aproveitamento de créditos decorrentes da aquisição de insumos em seu
art. 3º, inciso II, em redação idêntica àquela já existente para o Pis⁄Pasep, in
verbis:
Art. 3º Do valor
apurado na forma do art. 2º a pessoa jurídica poderá descontar créditos
calculados em relação a:
[...]
II - bens e
serviços, utilizados como insumo na
prestação de serviços e na produção ou fabricação de bens
ou produtos destinados à venda, inclusive combustíveis e lubrificantes,
exceto em relação ao pagamento de que trata o art. 2º da Lei nº10.485, de
3 de julho de 2002, devido pelo fabricante ou importador, ao concessionário,
pela intermediação ou entrega dos veículos classificados nas posições
87.03 e 87.04 da TIPI; (Redação dada pela Lei nº 10.865, de 2004)
Posteriormente, pela
edição da Emenda Constitucional n. 42⁄2003, de 31 de dezembro de 2003, o
princípio da não-cumulatividade das contribuições sociais alcançou o plano
constitucional através da inserção do § 12 ao art. 195, que assim dispôs:
Art. 195. A
seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e
indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos
orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e
das seguintes contribuições sociais:
I - do empregador, da
empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, incidentes sobre:
(Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998)
[...]
b) a receita ou o
faturamento;
[...]
§ 12. A
lei definirá os setores de atividade econômica para os quais
as contribuições incidentes na forma dos incisos I, b; e IV do caput,
serão não-cumulativas.
Da norma
constitucional em referência não se extrai a possibilidade de
dedução de créditos a todo e qualquer bem ou serviço adquirido para
consecução da atividade empresarial, restando expresso que a
regulamentação da sistemática da não-cumulatividade aplicável ao Pis e à Cofins
ficaria afeta ao legislador ordinário.
Interpretando o
conteúdo da legislação fiscal em comento, a Secretaria da Receita Federal
veiculou, pelas Instruções Normativas ns. 247⁄02 (redação alterada pela
Instrução Normativa 358⁄2003), e 404⁄04, orientação necessária à sua
execução, estabelecendo, para fins de aproveitamento de créditos, o
alcance do termo "insumo", ao dispor:
Instrução Normativa
SRF n. 247⁄2002 - PIS⁄Pasep
Art. 66. A pessoa
jurídica que apura o PIS⁄Pasep não-cumulativo com a alíquota prevista no
art. 60 pode descontar créditos, determinados mediante a aplicação da
mesma alíquota, sobre os valores:
I – das aquisições
efetuadas no mês:
[...]
b) de bens e
serviços, inclusive combustíveis e lubrificantes, utilizados como insumos:
(Redação dada pela IN SRF 358, de 09⁄09⁄2003)
b.1) na fabricação de
produtos destinados à venda; ou (Incluída pela IN SRF 358, de 09⁄09⁄2003)
b.2) na prestação de
serviços; (Incluída pela IN SRF 358, de 09⁄09⁄2003)
[...]
§ 5º Para os efeitos
da alínea "b" do inciso I do caput, entende-se como insumos:
(Incluído pela IN SRF 358, de 09⁄09⁄2003)
I - utilizados na
fabricação ou produção de bens destinados à venda: (Incluído pela IN SRF
358, de 09⁄09⁄2003)
a) as
matérias primas, os produtos intermediários, o material de embalagem e
quaisquer outros bens que sofram alterações, tais como
o desgaste, o dano ou a perda de propriedades físicas ou químicas, em
função da ação diretamente exercida sobre o produto em fabricação,
desde que não estejam incluídas no ativo imobilizado; (Incluído
pela IN SRF 358, de 09⁄09⁄2003)
b) os serviços prestados
por pessoa jurídica domiciliada no País, aplicados ou
consumidos na produção ou fabricação do produto; (Incluído pela IN
SRF 358, de 09⁄09⁄2003)
II - utilizados na
prestação de serviços: (Incluído pela IN SRF 358, de 09⁄09⁄2003)
a) os bens aplicados
ou consumidos na prestação de serviços, desde que não estejam incluídos no
ativo imobilizado; e (Incluído pela IN SRF 358, de 09⁄09⁄2003)
b) os serviços
prestados por pessoa jurídica domiciliada no País, aplicados ou consumidos
na prestação do serviço. (Incluído pela IN SRF 358, de 09⁄09⁄2003)
Instrução Normativa
SRF n. 404⁄2004 - Cofins
Art. 8º Do
valor apurado na forma do art. 7º, a pessoa jurídica pode descontar
créditos, determinados mediante a aplicação da mesma alíquota, sobre os
valores:
I - das aquisições
efetuadas no mês:
[...]
b) de bens e
serviços, inclusive combustíveis e lubrificantes, utilizados como insumos:
b.1) na produção ou
fabricação de bens ou produtos destinados à venda; ou
b.2) na prestação de
serviços;
[...]
§ 4º Para
os efeitos da alínea "b" do inciso I do caput, entende-se
como insumos:
I - utilizados na
fabricação ou produção de bens destinados à venda:
a) a
matéria-prima, o produto intermediário, o material de embalagem e
quaisquer outros bens que sofram alterações, tais como o desgaste,
o dano ou a perda de propriedades físicas ou químicas, em função
da ação diretamente exercida sobre o produto em fabricação, desde que
não estejam incluídas no ativo imobilizado;
b) os serviços prestados
por pessoa jurídica domiciliada no País, aplicados ou
consumidos na produção ou fabricação do produto;
II - utilizados na
prestação de serviços:
a) os bens aplicados
ou consumidos na prestação de serviços, desde que não estejam incluídos no
ativo imobilizado; e
b) os serviços
prestados por pessoa jurídica domiciliada no País, aplicados ou consumidos
na prestação do serviço.
[...]
O que se deduz da
leitura das referidas regras infralegais é que a apuração do creditamento
da Contribuição ao Pis e da Cofins foi restrita aos bens que
compõem diretamente os produtos da empresa (a matéria-prima, o produto
intermediário, o material de embalagem e quaisquer outros bens que sofram
alterações em função da ação diretamente exercida sobre o produto em
fabricação, desde que não estejam incluídas no ativo imobilizado) ou
prestação de serviços aplicados ou consumidos na fabricação do
produto.
A definição de
"insumos" adotada pelos normativos da Secretaria da Receita
Federal, excessivamente restritiva em relação aos serviços utilizados na
produção e em relação aos bens também utilizados na produção, em tudo se
assemelha à definição de "insumos" para efeito de creditamento
do Imposto sobre Produtos Industrializados - IPI, ditada pelo art. 226 do
Decreto n. 7.212⁄2010. Transcrevo essa última norma para efeito comparativo:
Decreto n. 7.212⁄2010
- RIPI⁄2010
Art. 226. Os
estabelecimentos industriais e os que lhes são equiparados poderão
creditar-se (Lei nº 4.502, de 1964, art. 25):
I - do
imposto relativo a matéria-prima, produto intermediário e material
de embalagem, adquiridos para emprego na industrialização de produtos
tributados, incluindo-se, entre as matérias-primas e os produtos
intermediários, aqueles que, embora não se integrando ao novo produto,
forem consumidos no processo de industrialização, salvo se compreendidos
entre os bens do ativo permanente;
[...]
Ocorre que, como
veremos, não há respaldo legal para que seja adotado
conceito excessivamente restritivo de "utilização na produção"
(terminologia legal), tomando-o por "aplicação ou consumo direto na
produção" e para que seja feito uso, na sistemática do Pis⁄Pasep e
Cofins não-cumulativos, do mesmo conceito de "insumos" adotado
pela legislação própria do IPI.
4. Da impossibilidade
de ser adotado o conceito de "insumos" próprio do IPI.
Com efeito, reitero
não ser possível que a sistemática do Pis⁄Pasep e Cofins não-cumulativos
colha o mesmo conceito de "insumos" adotado pela legislação própria
do IPI. Isto porque quando o legislador deseja importar tal conceituação
de "insumos" para fins de cálculo de benefícios fiscais, o faz
expressamente, como o fez, v.g., na hipótese do crédito presumido de IPI,
como ressarcimento das contribuições ao Pis⁄Pasep e à Cofins, previsto
no art. 1º, da Lei n. 9.363⁄96.
Na suso citada lei,
há expressa previsão para que sejam utilizados subsidiariamente os
conceitos de produção, matéria-prima, produtos intermediários e material de
embalagem previstos na legislação do IPI.
Veja-se:
Lei n. 9.363⁄96
Art. 3o Para
os efeitos desta Lei, a apuração do montante da receita operacional bruta,
da receita de exportação e do valor das matérias-primas, produtos
intermediários e material de embalagem será efetuada nos termos das normas
que regem a incidência das contribuições referidas no art. 1o,
tendo em vista o valor constante da respectiva nota fiscal de venda
emitida pelo fornecedor ao produtor exportador.
Parágrafo único. Utilizar-se-á, subsidiariamente, a
legislação do Imposto de Renda e do
Imposto sobre Produtos Industrializados para o estabelecimento, respectivamente,
dos conceitos de receita operacional
bruta e de produção, matéria-prima,
produtos intermediários e material de embalagem.
Diferentemente, nas
leis que tratam do Pis⁄Pasep e Cofins não cumulativos não há menção a
qualquer arcabouço normativo em vigor para se colher o conceito de
"insumos".
Na mesma linha de
raciocínio, outras razões também se me afiguram suficientes a impedir a
utilização do conceito de "insumos" previsto para a legislação do
IPI.
Vejamos.
O regime da
não-cumulatividade do IPI, cuja materialidade é o produto industrializado,
encontra expressão no art. 153, § 3º, II, da Constituição Federal, e permite
"a compensação do que for devido em cada operação com o montante
cobrado nas anteriores", a fim de impedir que a carga tributária
incidente sobre cada etapa da cadeia produtiva integre a base de cálculo
das etapas seguintes, o que anularia a sistemática da unitributação do
IPI. Desse modo, desconta-se o débito da saída do produto com o valor do
crédito da entrada do insumo que foi aplicado no produto industrializado,
fazendo com que haja a compensação dos valores cobrados nas etapas
anteriores. Por tal razão, o conceito de "insumo" para fins
de não-cumulatividade do IPI, o qual teve sua amplitude exposta na própria
legislação de regência, restringe-se basicamente às matérias-primas,
produtos intermediários e materiais de embalagem, bem como aos produtos
que são consumidos no processo de industrialização, que tenham efetivo
contato com o produto. Na definição clássica adotada pela Secretaria
da Receita Federal: "insumo é aquilo que se integra de forma
física ou química ao novo produto ou aquilo que sofre consumo, desgaste ou
alteração de suas propriedades físicas ou químicas durante o processo de
industrialização mediante contato físico com o produto" (REsp.
n. 1.049.305 – PR, Segunda Turma, Rel. Min. Mauro Campbell Marques,
julgado em 22.3.2011).
Por sua vez, a
não-cumulatividade da contribuição ao Pis e da Cofins instituída
pelas Leis 10.637 e 10.833 - ainda que a expressão utilizada pelo
legislador seja idêntica - apresenta perfil totalmente diverso daquela
pertinente ao IPI, visto que a previsão legal possibilita a dedução dos
valores de determinados bens e serviços suportados pela pessoa jurídica
dos valores a serem recolhidos a título dessas contribuições, calculados
pela aplicação da alíquota correspondente sobre a totalidade das receitas
por ela auferidas. Como se verifica na técnica de arrecadação dessas
contribuições, não há propriamente um mecanismo não cumulativo, decorrente
do creditamento de valores das entradas de bens que sofrerão nova incidência
em etapa posterior da cadeia produtiva, nos moldes do que existe para
aquele imposto (IPI).
Considera-se, ainda,
que a hipótese de incidência dessas contribuições leva em consideração
"o faturamento mensal, assim entendido como o total das receitas
auferidas pela pessoa jurídica, independentemente de sua denominação ou
classificação contábil" (artigos 1º das Leis ns. 10.637⁄02 e
10.833⁄03). Ou seja, esses tributos não têm sua materialidade restrita
apenas aos bens produzidos, mas sim à aferição de receitas, cuja amplitude
torna inviável a sua vinculação ao valor exato da tributação incidente em
cada etapa anterior do ciclo produtivo.
Note-se também que,
para fins de creditamento do Pis e da Cofins, admite-se que a prestação de
serviços seja considerada como insumo, o que já leva à conclusão de que
as próprias Leis 10.637⁄2002 e 10.833⁄2003 elasteceram a definição de
"insumos", não se limitando apenas aos elementos físicos que compõem
o produto. Nesse ponto, quanto à abrangência dada pela legislação de
regência ao admitir que serviços sejam considerados como insumos de
produção ou fabricação, destacam-se os ensinamentos de Marco Aurélio Grego
(in "Conceito de insumo à luz da legislação de PIS⁄COFINS",
Revista Fórum de Direito Tributário RFDT, ano1, n. 1, jan⁄fev.2003, Belo
Horizonte: Fórum, 2003, grifo nosso):
As leis mencionadas preveem
expressamente que o serviço pode ser utilizado como insumo na produção ou
fabricação. Ora, como um serviço (atividade +
utilidade) pode ser insumo da produção ou da fabricação de um bem?
Será efetivamente
insumo sempre que a atividade ou a utilidade forem necessárias à
existência do processo ou do produto ou agregarem (ao processo ou ao
produto) alguma qualidade que faça com que um dos dois adquira determinado
padrão desejado. Vale dizer, quando atividade ou
utilidade contribuírem para o processo ou o produto existirem ou terem
certas características.
Na medida em que os
serviços configuram insumos no âmbito de PIS⁄COFINS, pois as respectivas
utilidades são fruídas como tal (por condicionarem a existência ou
integrarem funcionalmente o processo ou o produto), então os bens também
estarão sendo utilizados como insumo na medida em que das utilidades que
deles emanarem dependam a existência ou a qualidade do processo ou
produto.
(...) Vale
dizer, "utilizar como insumo" é extrair os bens ou dos
serviços todas as utilidades que lhes sejam próprias para o fim de fazer
com que o processo produtivo ou o produto destinado a venda
existam ou tenham as características almejadas. Vale dizer,
fazer com que - no específico contexto da atividade econômica desenvolvida
pelo contribuinte - processo e produto sejam o que são.
Portanto, o
conceito de insumo adotado pelas Leis é amplo a ponto de abranger
até mesmo as utilidades disponibilizadas através de bens e serviços, desde
que relevantes para o processo ou para o produto. Terem
as leis de regência admitido créditos relativos a "serviços
utilizados como insumos" é a prova cabal de que o conceito de
"utilização como insumo" no âmbito da não-cumulatividade de
PIS⁄COFINS não tem por critério referencial o objeto físico, pois um
sem número de serviços não interfere direta nem fisicamente com o produto
final; limita-se a assegurar que o processo exista ou se desenvolva
com as qualidades pertinentes.
A lição do ilustre
doutrinador introduz os conceitos de essencialidade e necessidade ao
processo produtivo. Sobre eles me debruçarei mais adiante.
Continuando o
raciocínio, da própria redação das referidas leis, extrai-se
a impertinência da utilização de parâmetros da legislação do IPI para
definir o vocábulo "insumo" a regular o creditamento do Pis e da
Cofins, na medida em que, para o IPI, não há previsão de creditamento de
"serviços", e, para aquelas contribuições, os serviços poderão
ser creditados como insumos ainda que não tenham interferência direta e
física com o produto final. Veja-se, para exemplo, a Solução de Consulta
n. 30, de 26 de janeiro de 2010 (9ª Região Fiscal, Divisão de Tributação,
DOU de 04.02.2010), onde a Secretaria da Receita Federal entendeu
que, ipsis verbis:
"[...] a
contratação de mão de obra de pessoas jurídicas para operação e manutenção
de equipamentos da linha de produção e a contratação de serviços
de pessoas jurídicas aplicados diretamente sobre o produto em
transformação ou sobre as ferramentas utilizadas nas máquinas pertencentes
à linha de produção são considerados insumos, para fins de creditamento da
COFINS".
Ressalta-se, ainda,
que a não-cumulatividade do Pis e da Cofins não tem por objetivo eliminar
o ônus destas contribuições apenas no processo fabril, visto que a incidência
destas exações não se limita às pessoas jurídicas industriais, mas a todas
as pessoas jurídicas que aufiram receitas, inclusive prestadoras de
serviços (excetuando-se as pessoas jurídicas que permanecem vinculadas ao
regime cumulativo elencadas nos artigos 8º da Lei 10.637⁄02 e 10 da Lei
10.833⁄03), o que dá maior extensão ao contexto normativo desta contribuição do
que aquele atribuído ao IPI. Não se trata, portanto, de desonerar
a cadeia produtiva, mas sim o processo produtivo de um determinado
produtor ou a atividade-fim de determinado prestador de serviço.
Parece-nos acertada,
desse modo, a orientação de Marco Aurélio Grego (idem, ib idem)
quando sinaliza para a diferenciação da sistemática adotada pelos tributos a
impedir que o conceito de "insumo" no Pis⁄Cofins não cumulativo
seja tomado por empréstimo da legislação do IPI:
No caso, estamos
perante contribuições cujo pressuposto de fato é a receita ou o
faturamento, portanto, sua não-cumulatividade deve ser vista como
técnica voltada a viabilizar a determinação do montante a recolher em
função deles (receita⁄faturamento).
Enquanto o processo
formativo de um produto aponta no sentido de eventos a ele relativos, o
processo formativo da receita ou do faturamento aponta na direção de todos
os elementos (físicos ou funcionais) relevantes para sua obtenção. Vale dizer, por
mais de uma razão o universo de elementos captáveis pela
não-cumulatividade de PIS⁄COFINS é mais amplo que o do IPI.
Embora a
não-cumulatividade seja técnica comum a IPI e a PIS⁄COFINS, a diferença de
pressuposto de fato (produtos industrializado versus receita)
faz com que assuma dimensão e perfil distintos. Por isso,
pretender aplicar na interpretação das normas de PIS⁄COFINS critérios ou
formulações construídas em relação ao IPI é:
a) desconsiderar os
diferentes pressupostos constitucionais;
b) agredir a
racionalidade da incidência de PIS⁄COFINS; e
c) contrariar a
coerência interna da exigência, pois esta se forma a partir do pressuposto
"receita⁄faturamento" e não do pressuposto "produto".
Em suma, palavra
utilizada em contexto cujo pressuposto de fato é a receita ou o
faturamento assume sentido e alcance diferente do que resulta de contexto
em que o pressuposto de fato é o produto industrializado.
Aprofundando na
identificação dessas discrepâncias entre o método adotado para
a contribuição para o Pis e para a Cofins e aquele aplicado para o IPI e
para o ICMS, assim se manifestou José Antônio Minatel (in "Conteúdo
do Conceito de Receita e Regime Jurídico para sua tributação".
São Paulo: MP, 2005, p. 180):
Não sendo esse o
espaço para aprofundamento do tema da não-cumulatividade, quer-se
unicamente consignar que essa técnica adotada para a neutralização da
incidência daqueles impostos, que, como se disse, gravam a circulação de
bens (aqui tomada em sentido lato), não tem a mesma pertinência que a
recomende para ser introduzida no contexto da tributação da receita,
por absoluta falta de afinidade entre os conteúdos do pressuposto material
das diferentes realidades. Receita, como já dito, pressupõe conteúdo
material de mensuração instantânea, revelado pelo ingresso de recursos
financeiros decorrente de esforço ou exercício de atividade empresarial,
materializadora de disponibilidade pessoal para quem a aufere, conteúdo de
avaliação unilateral que não guarda relação de pertinência que permita
confrontá-la com qualquer operação antecedente, contrariamente ao que
sucede com o valor da operação de produtos industrializados e de
mercadorias.
Considerando todas
essas peculiaridades da nova sistemática de não-cumulatividade instituída
pelas Leis 10.637⁄2002 e 10.833⁄2003, as referidas Instruções Normativas
ns. 247⁄02 e 404⁄04 não poderiam simplesmente reproduzir o conceito de
insumo para fins de IPI (tributo cuja hipótese de incidência é a produção
de bem, e que, portanto, pode ter o vocábulo insumo limitado àqueles itens
que entram em contato direto com o produto final), restringindo,
por conseguinte, os bens⁄produtos cujos valores poderiam ser creditados
para fins de dedução das contribuições para o PIS e COFINS não cumulativos,
sob pena de distorcer o alcance que as referidas leis conferiram a esse
termo, obstaculizando a operacionalização da sistemática não cumulativa
para essas contribuições.
Vale ponderar ainda
que, embora seja autorizado o emprego de analogia diante de uma lacuna no
ordenamento jurídico, a teor da regra do art. 108, I, do CTN, o
próprio dispositivo restringe a sua aplicação ao dispor que somente será
cabível a interpretação analógica quando não resultar exigência de imposto não
previsto em lei (§1º). E, na hipótese em apreço, a aplicação por analogia
do termo "insumo" na forma definida pela legislação do IPI traz,
como consequência, o aumento de carga tributária.
Explico: As Leis
ns. 10.637⁄2002 e 10.833⁄2003 majoraram as alíquotas
das contribuições do Pis e da Cofins de 0,65% para 1,655 e de 3% para
7,6%, respectivamente. E, em contrapartida, criaram um sistema legal de
abatimento de créditos apropriados em razão das despesas e aquisições de bens e
serviços relacionados no art. 3º de ambas as leis. Da própria exposição de
Motivos da Medida Provisória n. 66, de 29 de agosto de 2002,
constou explicitamente que "constitui premissa básica do modelo a
manutenção da carga tributária correspondente ao que hoje se arrecada em
virtude da cobrança do PIS⁄PASEP". Assim, a restrição pretendida
pelas Instruções Normativas para o conceito de insumos aos
elementos consumidos no processo operacional, além de ir de encontro à
própria essência do princípio da não-cumulatividade, acaba por gerar a
ampliação da carga tributária das contribuições em comento.
Dessa forma, é
inexorável a conclusão de que os referidos atos normativos fazendários, ao
validarem o creditamento apenas quando houver efetiva incorporação
do insumo ao processo produtivo de fabricação e comercialização de bens ou
prestação de serviços, adotando o conceito de insumos com acepção restrita, em
analogia à conceituação adotada pela legislação do IPI, acabaram por
extrapolar os termos do ordenamento jurídico hierarquicamente
superior, in casu, as Leis ns. 10.637⁄2002 e 10.833⁄2003, pois vão
de encontro à finalidade da sistemática de não-cumulatividade da
Contribuição para o Pis e da Cofins.
Reconhecida a
ilegalidade das Instruções Normativas 247⁄02 e 404⁄04, por
adotarem definição de insumos semelhante à da legislação do IPI, impede
definir agora qual seria a exegese para o termo mais condizente com a
sistemática da não-cumulatividade dascontribuições em apreço.
5. Da busca do
conceito de "insumos" aplicável às contribuições para
o Pis⁄Pasep e Cofins não cumulativas: impossibilidade de utilização
exclusiva da legislação do IR.
Especificamente em
relação ao art. 3º das 10.637⁄2002 e 10.833⁄2003, a doutrina especializada
e notoriamente produzida no âmbito dos escritórios de advocacia tributária
tem se orientado no sentido de que o termo "insumo" ali tratado
compreende não só matérias-primas, produtos intermediários e materiais de
embalagens, como também todos os demais custos
de produção e despesas operacionais incorridos
pelo contribuinte na fabricação de seus produtos e prestação de serviços.
Adota-se, para chegar a essa conceituação, o disciplinamento de custos e
despesas inerentes à obtenção de receitas passíveis de dedução para fins
de determinação do lucro real, na forma delineada pelos arts. 290 e 299 do
Regulamento do Imposto de Renda, diante da afinidade entre os custos
de produção e despesas operacionais e as receitas tributáveis pelo Pis e
pela Cofins não cumulativos.
Sobre o tema, peço
vênia para citar as lições de Ricardo Mariz de Oliveira (in, "Aspectos
Relacionados à 'não-cumulatividade' da COFINS e da Contribuição ao PIS".
PIS - COFINS - Questões Atuais e Polêmicas. FISCHER, Octavio Campos;
PEIXOTO, Marcelo Magalhães - coord., São Paulo: Quatier Latin, 2005, p.
48, grifo nosso):
Um bom e seguríssimo
critério para a constatação do que seja insumo é o de custo por absorção,
descrito para fins do imposto de renda pelo Parecer Normativo CST n. 6, de
2.2.1979.
Com feito, a lei
sobre o imposto de renda tem uma relação de custos advinda do Decreto-lei
n. 1.598⁄77 e que hoje está refletida nos arts. 290 e 291 do RIR⁄99. Mas
ela é meramente exemplificativa e não exaustiva, conforme esclareceu
o referido Parecer Normativo CST n. 6⁄79, e conforme é
reconhecido indiscutivelmente pela doutrina e pela jurisprudência.
Todos os itens que
integram o custo devem gerar deduções perante
a contribuição ao Pis e a Cofins, quando incorridos perante pessoas
jurídicas domiciliadas no País, e quando não incidirem em qualquer das
barreiras legais às deduções, acima expostas.
Por pertinente,
transcrevo ainda o escólio de Natanael Martins ("O Conceito
de Insumo na Sistemática Não-Cumulativa do PIS e da COFINS", in PIS
- COFINS - Questões Atuais e Polêmicas. op.cit., p. 207):
Entretanto, pode-se
desde logo afirmar que, com certeza, o conceito de insumo, contemplado na
sistemática não-cumulativa do PIS⁄COFINS está relacionado ao fato de
determinado bem ou serviço ter sido utilizado, ainda que de forma
indireta, na atividade de fabricação do produto ou com a finalidade
de prestar um determinado serviço.
Assim sendo, a toda
evidência, o conceito de insumo pode se ajustar a todo consumo
de bens ou serviços que se caracterize como custo segundo
a teoria contábil, visto que necessários ao processo fabril ou de
prestação de serviços como um todo. É dizer, "bens e
serviços utilizados como insumo na fabricação de produtos destinados à
venda ou na prestação de serviços", na acepção da lei, refere-se a
todos os dispêndios em bens e serviços relacionados ao processo fabril ou
de prestação de serviços, ou seja, insumos seriam aqueles bens e serviços
contabilizados como custo de produção, nos termos do art. 290,
do Regulamento do Imposto de Renda.
Compartilhando dessa
interpretação, o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais do Ministério
da Fazenda - CARF⁄MF já se manifestou no sentido de que o conceito
de insumos para o Pis e a Cofins não guarda simetria com aquele delineado
nas legislações do IPI, alargando-se, assim, a abrangência desse termo de
modo a contemplar todos os dispêndios necessários ao processo
produtivo do contribuinte. Para tanto, seguiu a orientação
doutrinária acima transcrita para adotar a acepção do vocábulo
conferida pelo Regulamento do Imposto de Renda. O julgado recebeu
a seguinte ementa:
REGIME NÃO
CUMULATIVO. INSUMOS. MATERIAIS PARA MANUTENÇÃO DE MÁQUINAS.
O conceito de insumo
dentro da sistemática de apuração de créditos pela não cumulatividade de
PIS e COFINS deve ser entendido como todo e qualquer custo ou
despesa necessária à atividade da empresa, nos termos da legislação
do IRPJ, não devendo ser utilizado o conceito trazido pela legislação do
IPI, uma vez que a materialidade de tal tributo é distinta da
materialidade das contribuições em apreço (CARF, Recurso n. 369.519,
Processo n. 11020.001952⁄2006-22, 2ª Câmara, Sessão de 08.12.2010).
Por oportuno,
transcrevo trecho do voto condutor proferido pelo Conselheiro Gilberto de
Castro Moreira Junior, ao julgar o processo suso referido (citado nos
memoriais apresentados pela ora recorrente, grifo nosso):
Neste cenário, é
absolutamente certo que o conceito de insumo aplicável ao PIS e COFINS
deve ser o mesmo aplicável ao imposto de renda, visto que, para se auferir
lucro, é necessário antes se obter receita. A materialidade
das contribuições ao PIS e COFINS é bastante mais próxima daquela
estabelecida ao IRPJ do que daquela prevista para o IPI. De fato,
em vista da natureza das respectivas hipóteses de incidência
(receita⁄lucro⁄industrialização), o conceito de custos previsto na
legislação do IRPJ (artigo 290 do RIR⁄99), bem como o de despesas operacionais
previsto no artigo 299 do RIR⁄99, é bem mais próprio de ser aplicado ao
PIS e COFINS não cumulativos do que o conceito previsto na legislação do
IPI.
Nas palavras de
Ricardo Marins de Oliveira, "constituem-se insumos para a
produção bens ou serviços não apenas as matérias-primas, os
produtos intermediários, os materiais de embalagem e outros bens quando
sofram alteração, mas todos os custos diretos e indiretos de produção,
e até mesmo despesas que não sejam registradas contabilmente a
débito de custo, mas que contribuam para a produção" (...)
Nota-se, deste modo,
que a não cumulatividade do PIS e da COFINS encontra-se vinculada ao
faturamento da empresa, ou seja, a todas as forças realizadas pela empresa
com o intuito de desenvolvimento de suas atividades, devendo o conceito de
insumo estar intimamente vinculado a tal característica.(...)
É de se concluir,
portanto, que o termo "insumo" utilizado para o
cálculo do PIS e COFINS não cumulativos deve necessariamente compreender
os custos e despesas operacionais da pessoa jurídica, na forma definida
nos artigos 290 e 299 do RIR⁄99, e não se limitar apenas ao conceito
trazido pelas Instruções Normativas n. 247⁄02 e 404⁄04 (embasadas
exclusivamente na (inaplicável) legislação do IPI).
No caso dos autos foram
glosados pretendidos créditos relativos a valores de despesas que a
Recorrente houve por bem classificar como insumos (materiais utilizados
para manutenção de máquinas e equipamentos), em virtude da essencialidade dos
mesmos para fabricação dos produtos destinados à venda.
Ora, constata-se que
sem a utilização dos mencionados materiais não haveria a possibilidade de
a Recorrente destinar seus produtos à venda, haja vista a inviabilidade de
utilização das máquinas. Frise-se que o material utilizado para manutenção
sofre, inclusive, desgaste com o tempo.
Em virtude dos
argumentos expostos, em que pese o respeito pela I. Decisão proferida pela
Delegacia da Receita Federal de Julgamento em Porto Alegre (RS), ao não
admitir a apuração de créditos sobre os bens adquiridos pela
Recorrente, entendo que tal glosa não deve prosperar, uma vez que os
equipamentos adquiridos caracterizam-se como despesas necessárias ao
desenvolvimento de suas atividades, sendo certo o direito ao crédito sobre
tais valores para desconto das contribuições para o PIS e COFINS.
O ilustre Conselheiro
finaliza seu voto, favorável à utilização de créditos decorrentes de
materiais empregados na manutenção de máquinas e equipamentos, em virtude
da essencialidade dos mesmos para a fabricação dos
produtos destinados à venda (sobre isso falarei mais adiante), destacando
que o termo "insumo" utilizado para o cálculo do Pis e Cofins
não cumulativos deve necessariamente compreender os custos e despesas
operacionais da pessoa jurídica, na forma definida nos artigos 290 e 299
do RIR⁄99. Aqui é necessário frisar que o tema ainda não está
consolidado na jurisprudência administrativa, conforme o demonstrou a
FAZENDA NACIONAL ao apresentar julgado proferido pelo CARF em sentido
diverso (CARF, Recurso n. 155.695, Processo 11080.009434⁄2005-61, Sessão
de 06.05.2009).
Pois, bem. Em que
pesem as boas razões colocadas pela doutrina e pelo suso transcrito
julgado proferido no âmbito administrativo, não compartilho
do entendimento pela possibilidade de utilização isolada da legislação do
IR para alcançar a definição de "insumos" pretendida. Reconheço,
no entanto, que o raciocínio desenvolvido já ilumina o caminho para a
solução da controvérsia ao elencar a essencialidade ao processo
produtivo como atributo utilizável no conceito de
"insumos" e a desvinculação das definições próprias do IPI.
Como já mencionei o
legislador, quando deseja importar a conceituação de "insumos"
para fins de cálculo de benefícios fiscais, o faz expressamente, como o fez,
v.g., na hipótese do crédito presumido de IPI, como ressarcimento das
contribuições ao PIS⁄PASEP e à COFINS, previsto no art. 1º, da Lei n.
9.363⁄96.
Na já referida lei,
além da expressa previsão para que sejam utilizados subsidiariamente os
conceitos de produção, matéria-prima, produtos intermediários e
material de embalagem previstos na legislação do IPI, também há a previsão
para o uso dos conceitos de receita operacional bruta colhidos da legislação do
IR. Veja-se:
Lei n. 9.363⁄96
Art. 3o Para
os efeitos desta Lei, a apuração do montante da receita operacional bruta,
da receita de exportação e do valor das matérias-primas, produtos
intermediários e material de embalagem será efetuada nos termos das normas
que regem a incidência das contribuições referidas no art. 1o,
tendo em vista o valor constante da respectiva nota fiscal de venda
emitida pelo fornecedor ao produtor exportador.
Parágrafo
único. Utilizar-se-á, subsidiariamente, a legislação do
Imposto de Renda e do Imposto sobre Produtos Industrializados para
o estabelecimento, respectivamente, dos conceitos de
receita operacional bruta e de produção, matéria-prima,
produtos intermediários e material de embalagem.
Diferentemente, e já
mencionei isso quando afastei a utilização da legislação do IPI para
alcançar a conceituação pretendida, nas leis que tratam do Pis⁄Pasep e
Cofins não cumulativos não há menção a qualquer arcabouço normativo em
vigor para se colher o conceito de "insumos".
De outro ângulo, a
utilização da legislação do IR também encontra o óbice do excessivo
alargamento do conceito de "insumos" ao equipará-lo ao conceito
contábil de "custos e despesas operacionais" que abarca todos os
custos e despesas que contribuem para a produção de uma empresa, perdendo
a conceituação uma desejável proximidade ao processo produtivo e à
atividade-fim, que é o que se intenta desonerar, passando-se a desonerar
o produtor como um todo e não especificamente o processo produtivo. Como
já mencionei não se trata de desonerar a cadeia produtiva ou o
produtor, mas o processo produtivo de determinado produtor ou a
atividade-fim de determinado prestador de serviço.
O intuito de
desoneração da cadeia produtiva leva a um conceito restritivo
de "insumos", a exemplo do IPI. A desoneração do produtor,
independentemente da especificidade de sua atividade, leva a um conceito
ampliativo de "insumos", a exemplo das "despesas e custos
operacionais" do IR. Já a desoneração do processo produtivo, da
atividade específica desempenhada e daquilo que lhe é essencial, leva ao
conceito desejável de "insumos", que foi o objetivado pela lei.
Com efeito, o
conceito de “insumos” não é próprio da legislação do Imposto de Renda que
faz uso de termos jurídico-contábeis, a exemplo dos termos “Custos
de mercadorias ou serviços” e “Despesa Operacional”. Sob o signo “Despesas
Operacionais” se encontra uma miríade de despesas que sequer se aproximam de um
conceito formulado pelo senso comum de “insumos”. Veja-se (in, José
Carlos Marion. Contabilidade empresarial. 12. ed. São Paulo:
Atlas, 2006, p. 118 e ss.):
As Despesas
Operacionais são as necessárias para vender os
produtos, administrar a empresa e financiar as operações. Enfim, são
todas as despesas que contribuem para a manutenção da atividade
operacional da empresa.
Os principais grupos
de Despesas Operacionais são os especificados a seguir.
A. Despesas de Vendas
Abrangem desde a
promoção do produto até sua colocação ao cosumidor (comercialização e
distribuição).
São despesas com o
pessoal da área de venda, comissões sobre vendas, propaganda e
publicidade, marketing, estimativa de perdas com duplicatas derivadas de
vendas a prazo (provisão para devedores duvidosos) etc.
B. Despesas
Administrativas
São as necessárias
para administrar (dirigir) a empresa. De maneira geral, são gastos nos
escritórios visando à direção ou à gestão da empresa.
Como exemplos, temos:
honorários administrativos, salários e encargos sociais do pessoal
administrativo, aluguéis de escritórios, materiais de escritório, seguro
de escritório, depreciação de móveis e utensílios, assinaturas de jornais etc.
[...]
C. Despesas
Financeiras
São as remunerações
aos capitais de terceiros, tais como: juros pagos ou incorridos, comissões
bancárias, descontos concedidos, juros de mora pagos etc.
[...]
Variações monetárias
Devem ser
classificadas num subgrupo de Despesas Operacionais.
A legislação
brasileira exemplifica como variações Monetárias as variações cambiais.
O tema é assim
abordado no Regulamento do Imposto de Renda no que pertine às empresas que
produzem bens ou serviços (Decreto n. 3.000⁄99 – RIR-99):
Subseção III
Custo dos Bens ou Serviços
[...]
Custo de Produção
Art. 290. O
custo de produção dos bens ou serviços vendidos compreenderá,
obrigatoriamente (Decreto-Lei nº 1.598, de 1977, art. 13, § 1º):
I - o custo
de aquisição de matérias-primas e quaisquer outros bens ou serviços
aplicados ou consumidos na produção, observado o disposto no artigo anterior;
II - o
custo do pessoal aplicado na produção, inclusive de supervisão
direta, manutenção e guarda das instalações de produção;
III - os
custos de locação, manutenção e reparo e os encargos de depreciação dos
bens aplicados na produção;
IV - os
encargos de amortização diretamente relacionados com a produção;
V - os
encargos de exaustão dos recursos naturais utilizados na produção.
Parágrafo único. A
aquisição de bens de consumo eventual, cujo valor não exceda a cinco por
cento do custo total dos produtos vendidos no período de apuração
anterior, poderá ser registrada diretamente como custo (Decreto-Lei nº 1.598,
de 1977, art. 13, § 2º).
Quebras e Perdas
Art. 291. Integrará
também o custo o valor (Lei nº 4.506, de 1964, art.
46, incisos V e VI):
I - das
quebras e perdas razoáveis, de acordo com a natureza do bem e
da atividade, ocorridas na fabricação, no transporte e manuseio;
II - das
quebras ou perdas de estoque por deterioração, obsolescência ou pela
ocorrência de riscos não cobertos por seguros, desde que comprovadas:
a) por laudo ou
certificado de autoridade sanitária ou de segurança, que especifique e
identifique as quantidades destruídas ou inutilizadas e as razões
da providência;
b) por
certificado de autoridade competente, nos casos de incêndios, inundações
ou outros eventos semelhantes;
c) mediante
laudo de autoridade fiscal chamada a certificar a destruição de bens
obsoletos, invendáveis ou danificados, quando não houver valor
residual apurável.
[...]
Seção III
Custos, Despesas Operacionais e Encargos
Subseção I
Disposições Gerais
Despesas Necessárias
Art. 299. São
operacionais as despesas não computadas nos custos, necessárias à
atividade da empresa e à manutenção da respectiva fonte produtora (Lei nº 4.506,
de 1964, art. 47).
§ 1º São
necessárias as despesas pagas ou incorridas para a realização
das transações ou operações exigidas pela atividade da empresa (Lei nº 4.506,
de 1964, art. 47, § 1º).
§ 2º As
despesas operacionais admitidas são as usuais ou normais no tipo de
transações, operações ou atividades da empresa (Lei nº 4.506, de
1964, art. 47, § 2º).
§ 3º O
disposto neste artigo aplica-se também às gratificações pagas
aos empregados, seja qual for a designação que tiverem.
De fato, o excesso da
amplitude do conceito já foi identificado em doutrina, ao admitir a
exclusão do creditamento em relação às aquisições destinadas aos
setores administrativos. Ipsis verbis:
Dúvidas têm sido
suscitadas quanto ao real alcance da terminologia insumos na medida
provisória e se este abrangeria todas as aquisições efetuadas pela
pessoa jurídica, desde que destinadas à produção de produtos e serviços
destinados à venda, ou se limitariam às aquisições passíveis de créditos
nas legislações do ICMS e do IPI. A única interpretação possível
para o caso é de que todas as aquisições, exceto aquelas
destinadas aos setores administrativos propiciarão o direito de
crédito do PIS. Primeiramente, a nova legislação do PIS não
tem qualquer relação com as legislações do ICMS e do IPI. Em segundo
lugar, vedar o crédito na sua totalidade é tornar o PIS cumulativo.
Finalmente, insumos representam todos os itens que fazem parte do custo de
fabricação de produtos ou da prestação de serviços.
[...]
Feitas essas
considerações, fica patente que darão direito ao crédito do PIS,
todas as aquisições efetuadas pela pessoa jurídica alocadas no processo de
produção, exceto aquelas expressamente excluídas na MP nº 66 (Antonio S. Poloni, in "Comentários
sobre a Medida Provisória n. 66⁄2002".Disponível
em: <www.widesoft.com.br⁄users⁄fp⁄Artigo_MP66.html>. Acesso em:
10.06.2011).
Além disso, a base de
cálculo das contribuições ao Pis⁄Pasep e Cofins é a receita bruta da venda
de bens e serviços nas operações em conta própria ou alheia e todas as
demais receitas auferidas pela pessoa jurídica (art. 1º, da Lei n.
10.637⁄2002).
A exclusão do
"Custo das mercadorias ou serviços" e das "Despesas
Operacionais" da base de cálculo das contribuições ao Pis⁄Pasep e
Cofins, sob o pretexto de serem considerados “insumos”, acaba por
modificá-la por inteiro ao ponto de ser tributado somente o Lucro
Operacional (corresponde ao lucro relacionado ao objeto social da empresa)
somado às Receitas não Operacionais (receitas não relacionadas diretamente
com o objetivo social da empresa), desnaturando as contribuições e
aproximando a sua base de cálculo àquela do Imposto de Renda – IR e da
Contribuição Social sobre o Lucro Líquido - CSLL.
De observar que a
base de cálculo do Imposto de Renda nada mais é que o Lucro Operacional
somado ao Resultado não Operacional (diferença entre Receitas
não Operacionais e Despesas não Operacionais) com as inclusões e exclusões
previstas para a apuração do Lucro Real.
Se esse fosse o
objetivo do legislador, já teria produzido lei que assim o determinasse
expressamente. Seria muito mais simples, pois significaria a aplicação
de conceitos já sedimentados em doutrina e jurisprudência. Não o fez.
Preferiu adotar o signo “insumos” para definir o que pode ser abatido da base
de cálculo para efeito da não-cumulatividade. Fez uso de um conceito
jurídico indeterminado. Isso demonstra o intuito do legislador de
não abater da base de cálculo das contribuições ao PIS⁄COFINS todo e qualquer
Custo ou Despesa Operacional, como o deseja parte da doutrina e como decidiu
o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais – CARF em acórdão já aqui
referido.
Tais constatações
demonstram que o emprego da analogia, como forma de integração da legislação
tributária para se aferir o conceito de “insumos”, não é possível também
em relação aos conceitos de “Custos de mercadorias ou serviços” e “Despesa Operacional”
empregados na legislação do Imposto de Renda. É preciso, portanto, retornar
à norma que se pretende interpretar e dela mesma extrair o conceito.
6. Da fixação do
conceito de "insumos" aplicável às contribuições para o Pis
e Pasep e Cofins não cumulativas.
Rege o Código
Tributário Nacional que a segunda forma integrativa prevista no art. 108,
II, do CTN são os Princípios Gerais de Direito Tributário.
Tais princípios
recomendam que as normas de exceção devam ser
interpretadas restritivamente, isto porque dizem respeito a situações
excepcionais e específicas em oposição à regra geral. Nos dizeres de
Carlos Maximiliano (in, Hermenêutica e Aplicação do Direito.
19. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2001, p. 272): “Na dúvida, se decide contra
as isenções totais ou parciais, e a favor do fisco; ou melhor, presume-se
não haver o Estado aberto mão da sua autoridade para exigir tributos”.
É o que se dessume da
exposição de motivos da Medida Provisória n. 66⁄2002, in verbis:
3. O modelo ora
proposto traduz demanda pela modernização do sistema tributário brasileiro
sem, entretanto, pôr em risco o equilíbrio das contas públicas, na estrita
observância da Lei de Responsabilidade Fiscal. Com efeito,
constitui premissa básica do modelo a manutenção da carga
tributária correspondente ao que hoje se arrecada em virtude da
cobrança do PIS⁄Pasep.
O conceito de "insumos",
portanto, muito embora não possa ser o mesmo utilizado pela legislação do
IPI, pelas razões já exploradas, também não pode atingir o
alargamento proposto pela utilização de conceitos diversos contidos na
legislação do IR.
No entanto, da
teleologia da norma e da legislação e jurisprudência que regem o IPI e a
própria não-cumulatividade das contribuições ao Pis e Cofins podem ser colhidas
as características essenciais para o conceito de “insumos” a fim de
defini-lo para o caso em apreço. Dizem as leis sob exame:
Lei n. 10.637⁄2002 -
PIS
Art. 3o Do
valor apurado na forma do art. 2o a pessoa jurídica
poderá descontar créditos calculados em relação a: (Vide Lei nº 11.727, de
2008)
[...]
II - bens e
serviços, utilizados como insumo na prestação de serviços
e na produção ou fabricação de bens ou produtos destinados à
venda, inclusive combustíveis e lubrificantes, exceto
em relação ao pagamento de que trata o art. 2o da
Lei no 10.485, de 3 de julho de 2002, devido pelo
fabricante ou importador, ao concessionário, pela intermediação ou entrega
dos veículos classificados nas posições 87.03 e 87.04 da TIPI; (Redação
dada pela Lei nº 10.865, de 2004)
[...]
Lei n. 10.833⁄2003 -
COFINS
Art. 3o Do
valor apurado na forma do art. 2o a pessoa jurídica
poderá descontar créditos calculados em relação a: (Vide Medida
Provisória nº 497, de 2010)
[...]
II - bens e
serviços, utilizados como insumo na prestação de serviços
e na produção ou fabricação de bens ou produtos destinados à
venda, inclusive combustíveis e lubrificantes, exceto
em relação ao pagamento de que trata o art. 2, devido pelo fabricante ou
importador, ao concessionário, pela intermediação ou entrega dos veículos
classificados nas posições 87.03 e 87.04 da Tipi;
Do texto suso
transcrito colhe-se que nem todos os bens ou serviços, utilizados
na produção ou fabricação de bens geram o direito ao creditamento
pretendido. É necessário que essa utilização se dê na qualidade de
"insumo" ("utilizados como insumo"). Isto
significa que a qualidade de "insumo" é algo a mais que a mera
utilização na produção ou fabricação, o que também afasta a utilização dos
conceitos de "Custos e Despesas Operacionais" inerentes ao IR.
Não basta, portanto, que o bem ou serviço seja necessário ao processo
produtivo, é preciso algo há mais, algo mais específico e íntimo ao
processo produtivo.
Outrossim, a lei
menciona que se inserem no conceito de “insumos” para efeitos
de creditamento (art. 3º, II, da Lei n. 10.637⁄2002):
a) serviços utilizados
na prestação de serviços;
b) serviços utilizados
na produção ou fabricação de bens ou produtos destinados
à venda;
c) bens utilizados
na prestação de serviços;
d) bens utilizados
na produção ou fabricação de bens ou produtos destinados
à venda;
e) combustíveis e
lubrificantes utilizados na prestação de serviços;
f) combustíveis e
lubrificantes utilizados na produção ou fabricação de bens ou
produtos destinados à venda.
De observar que
serviços não são insumos para efeito de IPI e que os combustíveis
e lubrificantes, muito embora também não sejam compreendidos como insumos
para efeito de creditamento de IPI posto não serem consumidos em contato
direto com o produto e não se enquadrarem nos conceitos de matéria-prima
ou produto intermediário consta da listagem legal a definir o conceito de
insumos (ver art. 82, I, do Decreto n. 87.981⁄82 - RIPI⁄82; art. 147, I,
do Decreto n. 2.637⁄98 - RIPI⁄98; art. 164, I, do Decreto n. 4.544⁄2002 -
RIPI⁄2002 e art. 226, I, do Decreto n. 7.212⁄2010 - RIPI⁄2010; AgRg no
REsp 919628 ⁄ PR, Segunda Turma, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em
10.8.2010; REsp. n. 1.049.305 – PR, Segunda Turma, Rel. Min. Mauro
Campbell Marques, julgado em 22.3.2011 e Súmula n. 12, do 2º Conselho de
Contribuintes).
Outro ponto
importante é que os combustíveis e lubrificantes foram mencionados como
exemplos de insumos ("inclusive combustíveis e
lubrificantes") e a sua ausência impede mesmo o próprio processo
produtivo ou a prestação do serviço. Trata-se de bens essenciais ao
processo produtivo, muito
embora nem sempre sejam
nele diretamente empregados.
Também não se pode
perder de vista que o foco central da legislação é a desoneração do
processo produtivo e não somente da cadeia produtiva (caso da adoção do
conceito estrito de "insumos" do IPI) ou da atividade
empresarial como um todo (caso da adoção do conceito alargado de
"insumos" do IR). Desse modo, a pertinência do conceito é ao processo
produtivo e não ao funcionamento global da empresa. Daí reitero, não poder
ser utilizado o conceito abrangente de "Custos e Despesas
Operacionais", pois nem todo o custo ou despesa necessário ao
funcionamento de uma empresa é essencial ao processo produtivo.
Sendo assim, o que se
extrai de nuclear da definição de “insumos” para efeito do art. 3º, II, da
Lei n. 10.637⁄2002 - PIS e mesmo artigo da Lei n. 10.833⁄2003 - COFINS é que:
1º - O bem ou
serviço tenha sido adquirido para ser utilizado na prestação do serviço ou
na produção, ou para viabilizá-los (pertinência ao processo produtivo);
2º - A produção ou
prestação do serviço dependa daquela aquisição (essencialidade ao
processo produtivo); e
3º - Não se faz
necessário o consumo do bem ou a prestação do serviço em contato direto
com o produto (possibilidade de emprego indireto no processo produtivo).
Ora, se a prestação
do serviço ou produção depende da própria aquisição do bem ou serviço e do
seu emprego, direta ou indiretamente, na prestação do serviço ou na
produção, surge daí o conceito de essencialidade do bem ou serviço para
fins de receber a qualificação legal de insumo. Veja-se, não se trata da
essencialidade em relação exclusiva ao produto e sua composição, mas
essencialidade em relação ao próprio processo produtivo. Os
combustíveis utilizados na maquinaria não são essenciais à composição do
produto, mas são essenciais ao processo produtivo, pois sem eles as máquinas
param. Do mesmo modo, a manutenção da maquinaria pertencente à linha de
produção.
Outrossim, não basta,
que o bem ou serviço tenha alguma utilidade no processo produtivo ou na
prestação de serviço: é preciso que ele seja essencial. É preciso que a
sua subtração importe na impossibilidade mesma da prestação do serviço ou
da produção, isto é, obste a atividade da empresa, ou implique em
substancial perda de qualidade do produto ou serviço daí resultante. Veja-se
que este conceito já foi tocado por Marco Aurélio Grego em passagem que
transcrevemos ao enfrentar a impossibilidade de ser adotado o conceito de
"insumos" próprio do IPI. O mesmo conceito foi mencionado no voto
do Conselheiro Gilberto de Castro Moreira Junior, em passagem também já
citada de acórdão do CARF.
Já a possibilidade de
emprego indireto no processo produtivo decorre, além da menção aos
combustíveis e lubrificantes, do próprio afastamento das regras inerentes
aos insumos para efeito de IPI e da sua incompatibilidade com a prestação
de serviços.
Tem-se, portanto, um
conceito de insumos que se extrai da teleologia da própria norma para os
casos ali não expressos. Insumos, para efeitos do art. 3º, II, da Lei
n. 10.637⁄2002, e art. 3º, II, da Lei n. 10.833⁄2003 são todos aqueles
bens e serviços pertinentes ao, ou que viabilizam o processo
produtivo e a prestação de serviços,
que neles possam ser direta ou indiretamente empregados e cuja subtração
importa na impossibilidade mesma da prestação do serviço ou da produção,
isto é, cuja subtração obsta a atividade da empresa, ou implica em substancial
perda de qualidade do produto ou serviço daí resultantes.
Esse conceito não
sofre da excessiva restrição imposta pelas Instruções Normativas SRF n.
247⁄2002 e 404⁄2004, que importaram indevidamente o conceito de “insumos”
para efeito de creditamento de IPI, e não sofre da já demonstrada
excessiva elasticidade proposta pelo uso inapropriado dos conceitos de
“Custos e Despesas Operacionais”, próprios da lógica do Imposto de Renda.
7. Da solução ao caso
concreto.
Nessa esteira, penso
merecer censura o acórdão recorrido que decidiu pela impossibilidade de se
dar interpretação ao conceito de insumo a fim de permitir que
sejam deduzidos custos referentes aos materiais de desinfecção (limpeza) e
serviços de dedetização não utilizados diretamente no processo de
industrialização e comercialização do produto fabricado.
Isso porque, no caso
vertente, a recorrente é empresa fabricante de gêneros alimentícios
sujeita, portanto, a rígidas normas de higiene e limpeza. No ramo a que pertence às
exigências de condições sanitárias das instalações se não atendidas implicam na
própria impossibilidade da produção e em substancial perda de qualidade do
produto resultante.
Há perfeito
enquadramento na definição de insumos que foi extraída do art. 3º, II,
da Lei n. 10.637⁄2002, e do art. 3º, II, da Lei n. 10.833⁄2003. A assepsia
é essencial e imprescindível ao desenvolvimento de suas atividades. De ver
que, não houvesse os efeitos desinfetantes, haveria a proliferação de micro-organismos
na maquinaria e no ambiente produtivo que agiriam sobre os alimentos,
tornando-os impróprios para o consumo. Assim, impõe-se considerar a
abrangência ao termo "insumo" para contemplar, no creditamento,
os materiais de limpeza e desinfecção, bem como os serviços de
dedetização quando aplicados no ambiente produtivo de empresa
fabricante de gêneros alimentícios.
Pelas considerações
expostas, DOU PROVIMENTO ao recurso especial para assegurar o direito do
recorrente de aproveitar os créditos do Pis e da Cofins não cumulativos decorrentes
da aquisição de materiais de limpeza e desinfecção, bem como serviços
de dedetização aplicados no ambiente produtivo.
(...)
É como voto.
Em que pese a suso matéria julgada pela
Segunda Turma encontrar-se afetada à Primeira Seção através do instituto do recurso
repetitivo no REsp 1.221.170⁄PR, de relatoria do eminente Ministro
Napoleão Nunes Maia Filho, cujo julgamento está pendente onde sua decisão deverá
uniformizar definitivamente a jurisprudência infraconstitucional acerca do
assunto; o presente julgado é de extrema importância, haja vista o substancioso
voto do ministro Campbell seguido pela maioria de seus pares.
Em seu voto o ministro Campbell desconstruiu
o conceito de insumos previstos nas Instruções Normativas editadas pela Receita
Federal do Brasil, onde restringe significativamente o direito ao crédito do
PIS/PASEP e COFINS, visto ter se valido subsidiariamente e indevidamente da
conceituação estabelecida ao IPI – Impostos sobre Produtos Industrializados. Também,
não acatou a tese dos doutrinadores e advogados tributaristas que entendem que
o direito ao crédito do PIS/PASEP e COFINS deve basear-se nos custos e despesas
necessárias incorridas conforme legislação do Imposto de Renda.
Ao afastar as duas hipóteses, o eminente
Ministro construiu uma via alternativa para a definição de insumos fundada em
três premissas básicas que ao meu juízo é a solução para o deslinde da questão,
são elas:
1º - O
bem ou serviço tenha sido adquirido para ser utilizado na prestação do
serviço ou na produção, ou para viabilizá-los (pertinência ao processo produtivo); 2º - A produção ou prestação do serviço dependa daquela
aquisição (essencialidade ao
processo produtivo); e 3º - Não
se faz necessário o consumo do bem ou a prestação do serviço em contato
direto com o produto (possibilidade de
emprego indireto no processo produtivo).
E conclui que “Tem-se, portanto, um
conceito de insumos que se extrai da teleologia da própria norma para os
casos ali não expressos. Insumos, para efeitos do art. 3º, II, da Lei
n. 10.637⁄2002, e art. 3º, II, da Lei n. 10.833⁄2003 são todos aqueles
bens e serviços pertinentes ao, ou que viabilizam o processo
produtivo e a prestação de serviços,
que neles possam ser direta ou indiretamente empregados e cuja subtração
importa na impossibilidade mesma da prestação do serviço ou da produção,
isto é, cuja subtração obsta a atividade da empresa, ou implica em substancial
perda de qualidade do produto ou serviço daí resultantes”.
No que tange
ao caso concreto e diante de tais premissas, foi permitido à dedução de custos
referente aos materiais de desinfecção (limpeza) e serviços de
dedetização não utilizados diretamente no processo de industrialização e
comercialização do produto fabricado.
Tal permissivo, só é possível haja
vista “a recorrente ser empresa fabricante de gêneros alimentícios
sujeita, portanto, a rígidas normas de higiene e limpeza. No ramo a que
pertence às exigências de condições sanitárias das instalações se não
atendidas implicam na própria impossibilidade da produção e em substancial
perda de qualidade do produto resultante”.
Por fim, o magistrado afirma que “Há
perfeito enquadramento na definição de insumos que foi extraída do art. 3º, II,
da Lei n. 10.637⁄2002, e do art. 3º, II, da Lei n. 10.833⁄2003. A assepsia
é essencial e imprescindível ao desenvolvimento de suas atividades. De ver
que, não houvesse os efeitos desinfetantes, haveria a proliferação de
micro-organismos na maquinaria e no ambiente produtivo que agiriam sobre
os alimentos, tornando-os impróprios para o consumo. Assim, impõe-se
considerar a abrangência ao termo "insumo" para contemplar, no
creditamento, os materiais de limpeza e desinfecção, bem como os serviços
de dedetização quando aplicados no ambiente produtivo de empresa
fabricante de gêneros alimentícios”.