De há muito, se questiona a inclusão na
base de calculo do ICMS das gorjetas recebidas pelos garçons em bares,
restaurantes, hotéis e estabelecimentos similares; enquanto que, as normas
trabalhistas, bem como jurisprudência remansosa, entende que se trata de parcela
que deve integrar a remuneração do empregado.
Entretanto, a incidência do ICMS sobre as
gorjetas podem estar com os seus dias contados, na medida em que o Relator Des. Ricardo Dip
do
Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, em recente, decisão deu
provimento parcial a Apelação Cível 0035703-81.2010.8.26.0053[1],
11ª Câmara de Direito Público, julg. 27/08/2012 relativamente ao Mandado de Segurança Coletivo
impetrado pela Associação Brasileira de Bares e Restaurantes Seccional São
Paulo, ao
assim se manifestar: “Gorjeta é remuneração do empregado. Por isso que rendimento atrai a incidência de tributação federal, não
cabendo o concurso incidente de tributos municipais e estaduais sobre a propina,
pois não se pode admitir que sobre ela, fato jurídico unitário, recaiam
tributos aplicados por mais de uma pessoa política, certo que isso estaria a
configurar bitributação”.
Por outro lado, negou provimento ao pedido de
compensação retroativo aos 10 últimos anos referente ao ICMS recolhido
indevidamente sobre a mencionada parcela por entender não haver previsão legal
na legislação estadual Paulista.
Ante o exposto, e antes, porém, de entrarmos
nos fundamentos desta importante decisão, que, aliás, cabe recurso; vejamos o
que estabelecem as normas e jurisprudências de regência sobre as gorjetas referente
ao ICMS e sobre os direitos do trabalhador.
As
Regras do ICMS
A regra mandamental para sua inserção está
contida na Lei Complementar nº 87/96, art. 13, § 1º, II, b, determinando que integre
a base de calculo do ICMS o valor correspondente a demais importâncias pagas, recebidas ou debitadas;
portanto, dentro da expressão “demais
importâncias pagas” se encontra os valores recebidos a
título de gorjetas. Será mesmo? Bem, até pouco tempo, esta era a regra para
todos os Estados Federados.
Entretanto, o CONFAZ – Conselho Nacional de
Política Fazendária, na sua 144ª reunião ordinária, realizada em São Paulo, no
dia 16/12/2011 através do Convênio ICMS nº 125/11 alterado pelo convênio ICMS
70/12 autorizou os Estados de São Paulo, Espírito Santo e Distrito Federal a excluírem
a gorjeta da base de cálculo do ICMS incidente no fornecimento de alimentação e
bebidas promovido por bares, restaurantes, hotéis e estabelecimentos similares,
desde que limitada a 10% (dez por cento) do valor da conta, isto é, do valor
total consumido. Portanto, ultrapassado o limite estabelecido em Convênio a
diferença, a priori, deve ser incluída
na base de calculo do ICMS.
Oportuno observar que a fruição do
benefício ficará submetida às regras de controle dispostas na legislação
estadual de cada entidade tributante conveniada encontrando-se vigente desde 09/01/2012
através do Ato Declaratório nº 1/2012.
Com relação, portanto, aos Estados de São
Paulo, Espírito Santo e Distrito Federal a partir de 09/01/2012 as gorjetas e
nos limites estabelecidos (10% do valor consumido) estão excluídas da base de
calculo do ICMS.
As
Regras Trabalhistas
O art. 457 da CLT – Consolidação das Leis do
Trabalho dispõe que “Compreendem-se
na remuneração do empregado, para
todos os efeitos legais, além do salário devido e pago diretamente pelo
empregador, como contraprestação do serviço, as gorjetas que receber”.
O TST – Tribunal Superior do Trabalho
pacificou entendimento de que as gorjetas integram a remuneração do empregado conforme
pode ser observado no enunciado da Súmula nº 354,
colacionada a seguir:
GORJETAS. NATUREZA JURÍDICA. REPERCUSSÕES (mantida) - Res. 121/2003, DJ
19, 20 e 21.11.2003.
As
gorjetas, cobradas pelo empregador na nota de serviço ou oferecidas
espontaneamente pelos clientes, integram a remuneração do empregado, não
servindo de base de cálculo para as parcelas de aviso-prévio, adicional noturno,
horas extras e repouso semanal remunerado.(Grifamos)
Pelo que se analisa, à natureza jurídica da gorjeta
é remuneratória e como tal deve incidir os impostos e contribuições inerentes à
folha de pagamento dos empregados conforme remansa jurisprudência da Corte
Suprema e do Superior Tribunal de Justiça; cito os seguintes arestos: STF: RE 112.040, RE 596.695, AgR no Ag 692.437, AgR
no Ag 739.454 e STJ: REsp 399.596, REsp
107.143, REsp 776.152 e AgR no Ag 1.235.274, que em síntese determinam que a
gorjeta deve sofrer a incidência de, apenas, tributos e contribuições que
incidem sobre o salário; não cabendo, portanto, a concorrência incidental de
tributos municipais e estaduais sobre tais parcelas.
A Decisão do TJSP do
Mandado de Segurança Coletivo, Apelação
Cível 0035703-81.2010.8.26.0053.
A Associação Brasileira
de Bares e Restaurantes – Seccional São Paulo impetrou mandado de segurança
coletivo com objetivo de ser declarada
a inexigibilidade da incidência de ICMS sobre valores recebidos à conta de
gorjeta pelos associados da impetrante, bem como autorizar a compensação tributária
do que, a esse título, onerou, de fato, os mesmos associados, nos últimos dez
anos, postulando-se sobre o valor correspondente a aplicação da taxa SELIC.
Em seu voto o eminente relator posiciona-se no sentido de que a gorjeta é
remuneração, citando a legislação celetista, súmulas e jurisprudências já
mencionadas acima, que nortearam o espancamento da incidência do ICMS ao asseverar
que “Com efeito, se com a
gorjeta está a caracterizar-se um modo de remuneração, não se pode
admitir que sobre ela, fato jurídico unitário, recaiam tributos aplicados por
mais de uma pessoa política, certo que isso estaria a configurar bitributação”.
Por fim, para dar provimento ao pedido justifica dizendo que a inexigibilidade da incidência do ICMS
alcança somente os valores recebidos e repassados efetivamente aos garçons a
título de gorjeta.
Quanto à compensação do ICMS recolhido indevidamente (repetição de indébito),
relativamente aos 10 (dez) últimos anos sobre as parcelas remuneratórias pagas
aos garçons a título de gorjeta o pedido foi negado por não existir norma autorizadora
para a sua compensação com estabelecido no art. 170 CTN.
Conclusão
Ao nosso sentir, o fundamento trazido pelo novel
aresto ao excluir da base de calculo do ICMS a parcela referente às gorjetas,
por entender se tratar de verba remuneratória alcançada pelos impostos e
contribuições incidentes, tão somente sobre a folha de pagamento, é de singular
importância, pois, possui substrato jurídico relevante e consistente, que
certamente dará uma nova dinâmica junto aos Tribunais Pátrios.
[1]
Fonte: Consultor Jurídico - Matéria intitulada “Cobrança de ICMS sobre gorjeta
é ilegal, declara TJ-SP” de 18/09/2012.