Recentemente
os Ministros da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça julgou o RECURSO
ESPECIAL Nº 1.235.979 - RS (2011⁄0023711-3) de relatoria do ministro Herman Benjamin e designado relator para o
acórdão o ministro Mauro Campbell Marques, cuja recorrente é a empresa Johann
Alimentos Ltda e recorrida a Fazenda Nacional, manifestando favoravelmente ao
crédito de alguns insumos para composição da base de calculo das contribuições
do PIS e da COFINS conforme ementa a seguir:
EMENTA
TRIBUTÁRIO.
CONTRIBUIÇÕES AO PIS E COFINS NÃO CUMULATIVAS. CREDITAMENTO.
COMBUSTÍVEIS, LUBRIFICANTES E PEÇAS UTILIZADOS COMO INSUMOS
NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE ENTREGA DE MERCADORIAS VENDIDAS PELA
PRÓPRIA EMPRESA. ARTS. 3º, II, DAS LEIS N. N. 10.637⁄2002 E 10.833⁄2003.
1. O creditamento
pelos insumos previstos no art. 3º, II, da Lei n. 10.833⁄2003 e da Lei n.
10.637⁄2002 abrange os custos com peças, combustíveis e
lubrificantes utilizados por empresa que, conjugada com a venda de
mercadorias, exerce também a atividade de prestação de serviços de
transporte da própria mercadoria que revende.
2. Recurso especial
provido.
A síntese da controvérsia diz respeito
a “Hipótese em que a empresa, comerciante de gêneros alimentícios, defende
a possibilidade de obtenção de créditos de PIS e COFINS sobre aquisição
de combustíveis, lubrificantes e peças de reposição utilizados em veículos
dos quais faz uso para entrega de mercadorias por ela comercializadas”.
Em seu voto, o Ministro relator Herman
Benjamin tece algumas considerações no que tange aos aspectos constitucionais
do regime não cumulativo do PIS/COFINS e o princípio constitucional da estrita
legalidade em matéria de exoneração fiscal dizendo que “Ao tratar da não
cumulatividade aplicável ao IPI e ao ICMS, a Constituição Federal
determina que tais tributos devam ser não cumulativos, compensando-se
o que for devido em cada operação com o montante cobrado nas anteriores
(arts. 153, § 3°, II, e 155, § 2°, I)”.
“A norma constitucional impõe comando a
ser observado pelo legislador infraconstitucional, que deve
necessariamente disciplinar a compensação do valor devido na operação com
aquele cobrado na anterior”.
“Diversamente, no tocante à instituição
do regime não cumulativo do PIS e da COFINS, o legislador constituinte
derivado (EC 42⁄2003) outorgou à discricionariedade do legislador
infraconstitucional a disciplina da matéria, inclusive para efeito de
definir os setores da atividade econômica a serem alcançados por essa sistemática
(art. 195, § 12)”.
“E não poderia ser de outra forma;
afinal, a aplicação da não cumulatividade visa à obtenção de neutralidade
fiscal em hipóteses de tributação plurifásica, o que, por excelência, se
verifica nas exações incidentes sobre operações de circulação de bens e
serviços”.
A rigor, portanto, não há
verdadeiramente cumulatividade a ser evitada na tributação da receita.
“Em recente julgado, a Primeira Turma
do STF assentou que “A previsão de estabelecimento de diferentes regimes
tributários pela Lei nº 10.6372002, de modo a limitar deduções da base de
cálculo do PIS e da COFINS a determinado grupo de empresas, não implica
ofensa ao princípio da isonomia”. Não cabe ao judiciário imiscuir-se no
mérito das decisões políticas adotadas pelo legislador e pela Administração
tributária" (AI 837957 AgR, Relator: Min. Roberto Barroso, Primeira Turma,
DJe-094, 19.5.2014)”.
“Claro está que o legislador
infraconstitucional pode limitar a apuração de créditos do PIS e da COFINS
não cumulativos”.
“Acrescente-se que o art. 150, § 6°, da
Constituição Federal impede que qualquer subsídio ou isenção, redução de
base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou
remissão, relativos a impostos, taxas ou contribuições, seja concedido sem
lei específica, federal, estadual ou municipal, que regule exclusivamente
as matérias acima enumeradas ou o correspondente tributo ou contribuição,
sem prejuízo do disposto no art. 155, § 2.º, XII, g”.
“Em outras palavras, não cabe ao
legislador conceder exoneração fiscal genérica, tampouco ao intérprete
ampliar o benefício concedido. Normas excepcionais devem ser interpretadas
restritivamente, conforme clássica regra hermenêutica”.
“Penso, portanto, que, a prevalecer
orientação contrária, vulneram-se as normas constitucionais acima
descritas”.
O eminente relator trata ainda dos
limites da causa de pedir inicial e a divergência inaugurada pelo ministro
Cesar Asfor Rocha (aposentado) manifestando que “Saliente-se que, como
expressamente atestou o Tribunal a quo e foi confirmada
pelo advogado da recorrente na bem exposta sustentação oral proferida na sessão
de 10.5.2011, embora conste no contrato social da empresa que ela presta serviço
de transporte de cargas, o benefício pretendido na presente demanda envolve unicamente
os produtos utilizados na entrega das mercadorias próprias, ou seja, empregados
na atividade de simples comercialização de alimentos”.
“Nesse ponto, peço vênia ao eminente
Ministro Cesar Asfor Rocha para divergir de seu judicioso voto divergente
e para manter meu entendimento”.
“Sua Excelência deu relevância ao fato
de constar como objeto social da recorrente o transporte rodoviário de
cargas em geral. Sucede que o juiz não pode se afastar da causa de pedir
inicial, sob pena de incorrer em julgamento extra petita. E a causa
de pedir inicial não se refere à prestação de serviços de transporte
rodoviário, mas unicamente à venda de produtos, incluindo a subsequente
entrega com o emprego de veículos da empresa vendedora”. Confira-se:
“A presente demanda visa afastar
a proibição imposta pela Autoridade Coatora de a empresa se creditar dos
valores de PIS e da COFINS sobre a aquisição de combustíveis,
lubrificantes e peças de reposição utilizados pelos veículos que
servem exclusivamente para entrega dos produtos vendidos pela empresa (fl.
4, e-STJ)”.
Ainda o relator do processo, caminha
esclarecendo sobre a irrelevância do conceito de insumo para o caso concreto e
quanto às atividades que permitem a dedução de insumos: prestação de serviços e
produção ou fabricação de bens ou produto nos seguintes termos: “Nesse
contexto, parece-me irrelevante para a resolução da controvérsia o conceito
de insumo no regime das Leis 10.637⁄2002 e 10.833⁄2003”.
“Essas leis instituíram o regime não
cumulativo para o PIS e a COFINS, permitindo que o contribuinte pudesse
deduzir do valor a pagar, a título das contribuições, créditos referentes
a "bens e serviços, utilizados como insumo na prestação de serviços e
na produção ou fabricação de bens ou produtos destinados à venda". “Confira-se”:
“Art.
3º. Do valor apurado na forma do art. 2o a pessoa jurídica poderá
descontar créditos calculados em relação a”:
(...)
“II
- bens e serviços, utilizados como insumo na prestação de serviços e na
produção ou fabricação de bens ou produtos destinados à venda, inclusive
combustíveis e lubrificantes, exceto em relação ao pagamento de que trata
o art. 2° da Lei no 10.485, de 3 de julho de 2002, devido pelo fabricante ou
importador, ao concessionário, pela intermediação ou entrega dos veículos classificados
nas posições 87.03 e 87.04 da TIPI; (Redação dada pela Lei nº 10.865, de
2004)”
“A norma é clara ao dispor que os
insumos que propiciam ao contribuinte a obtenção de créditos estão
relacionados à prestação de serviços ou industrialização”.
“Dessa forma, independentemente do
conceito que se dê a insumo, a atividade desenvolvida pela recorrente –
simples comercialização de mercadorias, que não pode ser considerada
prestação de serviços ou industrialização – não foi contemplada pelo
legislador, de forma que não gera créditos de PIS e COFINS na forma do
art. 3º da Lei 10.637⁄2002 e da Lei 10.833⁄2003”.
“Não se pode equiparar os atos
relativos à tradição do bem comercializado à prestação de um serviço. De
acordo com o art. 490 do CC, "Salvo cláusula em contrário, ficarão as
despesas de escritura e registro a cargo do comprador, e a cargo do
vendedor as da tradição". A regra, portanto, é de que as despesas com a tradição
fiquem por conta do comerciante, razão pela qual a entrega do produto na execução
do contrato de compra e venda não configura prestação de serviço”.
“Nesse ponto, é preciso ressaltar que
pouco importa, para o deslinde da controvérsia travada na presente
demanda, o entendimento da Segunda Turma do Conselho Administrativo de
Recursos Fiscais – CARF, no sentido de alargar o conceito de insumo”.
“Isso porque, como muito bem lembrado
pelo e. Min. Mauro Campbell na sessão de 10.5.2011 – motivo do meu pedido
de vista regimental –, o CARF, ao proferir o acórdão 3202-00.226, no
julgamento do Recurso Voluntário 369.519, interposto por Móveis Ponzani
Ltda., entendeu que o conceito de insumo relacionado às hipóteses de
creditamento de PIS e COFINS não pode ser o mesmo utilizado para o IPI,
sendo aquele bem mais amplo”.
“No caso, o CARF, analisando o
recurso da fabricante de móveis, conferiu ao conceito de insumo uma
perspectiva mais ampla, para abranger todos os custos e despesas
operacionais da pessoa jurídica, mas sempre tendo como premissa que a
empresa dedica-se à industrialização ou à prestação de serviços, que, como
visto acima, são as atividades que proporcionam a obtenção de crédito, nos
termos do art. 3º das Leis 10.637⁄02 e 10.833⁄03. É o que se extrai do
voto proferido pelo Conselheiro Relator no mencionado julgamento”:
(...)
“Por outro lado, no âmbito de
PIS⁄COFINS a referência explícita é a "produção ou fabricação",
vale dizer, às ATIVIDADES e PROCESSOS de produzir ou fabricar, de modo que
a partir deste referencial deverá ser identificado o universo de bens e
serviços e reputados seus respectivos insumos”.
“Assim, em verdade, embora não
tenha analisado a mesma questão, já que, como afirmado, para o deslinde da
presente controvérsia pouco importa o conceito que se
dê a insumo, o entendimento do CARF corrobora a tese ora defendida,
pois parte da premissa – aqui reafirmada – de que as atividades que geram créditos
de PIS e COFINS restringem-se à industrialização e à prestação de serviços”.
Sustenta, ainda, a impossibilidade de
equiparar prestação de serviço a atividades vinculadas à tradição reafirmando
que “Por outro lado, como afirmado anteriormente, o fato de a empresa realizar
as entregas dos produtos que ela comercializa não descaracteriza a natureza de suas
atividades. Não há, aqui, elemento algum que possa ser considerado como industrialização
ou prestação de serviços, a fim de possibilitar o creditamento”.
“Ademais, não se pode confundir a
situação de um contribuinte que contrata outro para prestar o serviço de
frete com a daquele que faz a própria entrega das mercadorias que vende”.
“Na primeira hipótese, há um terceiro
na cadeia e, para não onerá-la demasiadamente, permite-se que o vendedor
credite-se de PIS e COFINS sobre o frete. Por outro lado, a empresa
transportadora arcará com o custo das contribuições sobre o valor da prestação
de seu serviço (descontando os créditos decorrentes dos insumos utilizados
em sua atividade)”.
“Já quando o próprio vendedor faz a
entrega, a cadeia é menor e, consequentemente, há menos etapas a serem
tributadas, daí por que não se autoriza o creditamento”.
Por derradeiro, na sustentação de seu
voto o Ministro relator Herman Benjamin para negar provimento ao Recurso
Especial e como consequência o não direito aos créditos pretendidos pela
recorrente trata da interpretação estrita em matéria de creditamento fiscal
colacionando, inclusive uma série de julgados da Corte Superior do STJ, reproduzido
parcialmente.
Diz o Ministro: “Convém destacar que
esta Corte Superior já firmou o entendimento de que somente é possível a
obtenção de créditos decorrentes da não cumulatividade quando houver
previsão legal e de que é admissível ao legislador estabelecer restrições ao
creditamento”. “Confiram-se”:
TRIBUTÁRIO. AGRAVO
REGIMENTAL. PIS E OFINS. LEIS 10.637⁄2002 E 10.833⁄2003. REGIME DA NÃO CUMULATIVIDADE. DESPESAS
DE FRETE. TRANSFERÊNCIA INTERNA DE MERCADORIAS ENTRE ESTABELECIMENTOS DA
MESMAEMPRESA. CREDITAMENTO. IMPOSSIBILIDADE. INTERPRETAÇÃO LITERAL.
1. Consoante decidiu
esta Turma, "as despesas de frete somente geram crédito quando
relacionadas à operação de venda e, ainda assim, desde que sejam
suportadas pelo contribuinte vendedor". Precedente.
2. O frete devido em
razão das operações de transportes de produtos acabados entre
estabelecimento da mesma empresa, por não caracterizar uma operação de
venda, não gera direito ao creditamento.
3. A norma que
concede benefício fiscal somente pode ser prevista em lei específica,
devendo ser interpretada literalmente, nos termos do art. 111 do CTN, não
se admitindo sua concessão por interpretação extensiva, tampouco
analógica. Precedentes.
4. Agravo regimental
não provido.
(AgRg no REsp
1335014⁄CE, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, DJe 8⁄2⁄2013).
PROCESSUAL CIVIL.
TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. RECURSO ORDINÁRIO. TEORIA DA CAUSA
MADURA. POSSIBILIDADE. AQUISIÇÃO DE BENS DESTINADOS AO ATIVO FIXO.
LIMITAÇÕES LEGAIS AO CREDITAMENTO DE ICMS. CONSTITUCIONALIDADE E
LEGALIDADE.
1. Na ação
mandamental, a impetrante pretende ser autorizada a compensar crédito de
ICMS oriundo da aquisição de bens destinados ao ativo permanente, uso e
consumo da impetrante, bem como quanto à aquisição de energia elétrica e serviços
de comunicação, sem a incidência das restrições qualitativas e temporais
impostas pelas Leis Complementares nºs 99⁄1999, 102⁄2000.
2. Desnecessária a
remessa dos autos ao Tribunal a quo, pois há que ser aplicado
o princípio da causa madura, por envolver matéria exclusivamente de
direito, nos termos do art. 515, § 3º, do CPC.
3. É possível o
creditamento de ICMS na aquisição de bens destinados ao ativo fixo após a
vigência da Lei Complementar 87⁄96. Entretanto, não há ilegalidade ou
inconstitucionalidade nas restrições qualitativas e temporais
estabelecidas por Leis Complementares posteriores ( 92⁄97, 99⁄99 e
102⁄2000).
4. Recurso ordinário
em mandado se segurança não provido.
(RMS 19.658⁄CE, Rel.
Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, DJe 27⁄11⁄2009).
Por sua vez, o Ministro Cesar Asfor
Rocha (aposentado) em seu voto-vogal divergiu do entendimento do ministro
relator se pronunciando da seguinte forma:
“Sr. Presidente, com o devido respeito,
vou votar divergindo do eminente Ministro Relator”.
“Não há dúvida, quanto à configuração
fática, de que a empresa, além de ser distribuidora de alimentos, tem em
seu objeto social, como parte dos objetivos, o transporte rodoviário de
cargas em geral. Evidentemente, há uma maior razão para distribuir a
mercadoria que ela própria vende que é uma opção que ela fez. Outras
empresas podem terceirizar essa entrega da mercadoria”.
“Sem dúvida nenhuma, essa atividade
integra o insumo da própria empresa. Os precedentes que foram trazidos
pelo eminente Relator, pelo que pude rapidamente verificar pelo nosso
sistema de informática, não se ajustam ao caso ora em debate, eles se
reportam a hipóteses desassemelhadas das que ora se cogita. Por isso,
entendo que, no caso das aquisições de combustíveis, lubrificantes e peças
de reposição, como aqui pontuado pela recorrente, ocorre, como a
própria recorrente referenciou, o fenômeno peculiar que justifica o
creditamento pretendido”.
“Por essa razão, com o devido respeito,
divirjo do voto do eminente Relator para conhecer do recurso especial e
dar-lhe provimento, conforme o postulado pela recorrente.”
De
outra parte, o ministro Mauro Campbell Marques designado relator do presente
acórdão manifesta seu voto na mesma linha da divergência inaugurada pelo
Ministro Asfor dizendo:
“Com efeito, o art. 3º, da Lei n. 10.833⁄2003,
registra expressamente que a pessoa jurídica poderá descontar créditos
calculados em relação aos bens adquiridos para revenda (art. 3º, I) e aos
bens e serviços utilizados como insumo na prestação de serviços e
na produção ou fabricação de bens ou produtos destinados à venda,
inclusive combustíveis e lubrificantes (art. 3º, II). Transcrevo:
Art. 3o Do valor apurado na forma do art. 2o a
pessoa jurídica poderá descontar créditos calculados em relação
a: (Produção de
efeito) (Vide Medida Provisória
nº 497, de 2010) (Regulamento)
I - bens adquiridos para revenda, exceto em
relação às mercadorias e aos produtos
referidos: (Redação dada pela Lei nº 10.865, de
2004)
a) nos incisos III e IV do § 3o do art. 1o desta
Lei; e (Incluído pela Lei nº 10.865,
de 2004)(Vide Medida Provisória nº 413, de
2008) (Vide Lei nº 11.727, de 2008).
b) nos §§ 1o e 1o-A do art. 2o desta
Lei; (Redação dada pela lei nº 11.787,
de 2008) (Vide Lei nº 9.718, de 1998)
II - bens e serviços, utilizados como insumo na
prestação de serviços e na produção ou fabricação de
bens ou produtos destinados à venda, inclusive combustíveis e
lubrificantes, exceto em relação ao pagamento de que trata o art. 2o da
Lei no 10.485, de 3 de julho de 2002, devido pelo fabricante ou importador,
ao concessionário, pela intermediação ou entrega dos veículos
classificados nas posições 87.03 e 87.04 da Tipi; (Redação dada pela Lei
nº 10.865, de 2004)
[...]
A menção expressa feita na lei aos "bens
adquiridos para revenda" traz para dentro do sistema não-cumulativo
as empresas cuja principal atividade é a comercialização
de mercadorias, como a recorrente JOHANN ALIMENTOS LTDA., que também
atua nos ramos de importação de alimentos, comércio atacadista de
alimentos, comércio varejista de alimentos, transporte rodoviário de
cargas e exportação de alimentos (...). Já a alusão aos "bens e serviços
utilizados como insumo na prestação de serviços" traz para dentro do
sistema não-cumulativo as empresas cuja principal atividade é a prestação
de serviços e, por fim, quando se menciona os "bens e serviços
utilizados como insumo na produção ou fabricação de bens ou
produtos", a situação de não-cumulatividade abrange o setor
industrial.
Desse modo, todas as etapas do ciclo produtivo (1ª
etapa: estabelecimento fabricante ou importador; 2ª
etapa: estabelecimento distribuidor atacadista, 3ª etapa: estabelecimento
comerciante varejista) são gravadas pelas contribuições ao
PIS⁄COFINSnão-cumulativas e todas essas etapas são, por isso, capazes de gerar
créditos.
Aliás, é da própria essência dos tributos
não-cumulativos que incidam sobre mais de uma etapa do circuito econômico,
pois só assim restará caracterizada a plurifasía. Sendo assim, com todas
as vênias ao Min. Herman Benjamin, o fato de a empresa recorrente JOHANN
ALIMENTOS LTDA. atuar no ramo do comércio atacadista é indiferente para
a solução desta demanda. O que importa aqui saber é se, conjugada
com essa venda de mercadorias, a empresa exerce também a atividade de
prestação de serviços de transporte da própria mercadoria que revende. Isto
porque é o próprio art. 3º, da Lei n. 10.833⁄2003, que dá expressamente o
direito ao creditamento para a pessoa jurídica pelos bens utilizados como
insumo na prestação de serviços, incluindo no conceito desses bens
os combustíveis e lubrificantes. Transcrevo novamente com os grifos
necessários:
Art. 3o Do valor apurado na forma do art. 2o a
pessoa jurídica poderá descontar créditos calculados em relação
a: (Produção de
efeito) (Vide Medida Provisória
nº 497, de 2010) (Regulamento)
[...]
II - bens e serviços, utilizados
como insumo na prestação de serviços e na produção ou
fabricação de bens ou produtos destinados à venda, inclusive combustíveis
e lubrificantes, exceto em relação ao pagamento de que trata o
art. 2o da Lei no 10.485, de 3 de julho de 2002, devido pelo fabricante ou
importador, ao concessionário, pela intermediação ou entrega dos veículos
classificados nas posições 87.03 e 87.04 da Tipi; (Redação dada pela Lei
nº 10.865, de 2004)
[...]
Em outras palavras, caracterizada a prestação
de serviços de transporte, ainda que associada à venda de suas próprias
mercadorias há de ser reconhecido o direito ao creditamento pelo valor
pago na aquisição das peças, combustíveis e lubrificantes necessários a esse
serviço, posto que insumos. E aqui, mais uma vez com as devidas
vênias, pondero que o que vincula o julgador não é a causa de pedir, mas o
pedido feito na inicial ("Jura novit curia"), razão pela
qual o argumento de se tratar de insumo aplicado na atividade de prestação
de serviços deve ser analisado consoante os fatos incontroversos fixados
nos autos ("Da mihi factum, dabo tibi jus").
A inserção dentro do objeto social da empresa da
atividade de transporte rodoviário de cargas em geral é fato incontroverso contra o qual
não houve qualquer impugnação por parte da FAZENDA NACIONAL. Outro fato
incontroverso é o de que o valor do transporte da mercadoria vendida está
embutido no preço de venda (faturamento), como custo que é da
empresa, ingressando assim na base de cálculo das contribuições ao
PIS⁄COFINS (receita bruta). Com custo do transporte e o
correspondente aumento do preço de venda há evidente agregação de valor,
pressuposto da tributação e também da aplicação da não-cumulatividade. O
registro foi feito na sentença, pelo Juiz de Primeiro Grau (...):
Nesse contexto, o reconhecimento do direito da
impetrante ao desconto pretendido decorre da aplicação direta da
interpretação da própria Secretaria da Receita do conceito de
insumo. A requerente distribui as mercadorias por ela vendidas com
frota própria de veículos. Com isso, a distribuição também
é objeto de sua atividade empresarial. Tanto é assim que o
contrato social prevê o "transporte rodoviário de cargas em
geral" como parte do objeto social (...).
A entrega rodoviária é um serviço prestado pela
impetrante, agregado à venda em si das mercadorias.
Os combustíveis, lubrificantes e peças de reposição
utilizadas pelos veículos da impetrante na atividade de distribuição são
indubitavelmente "bens aplicados ou consumidos" na prestação do
serviço, que não estão "incluídos no ativo imobilizado"
(Instruções Normativas transcritas, inciso II, a). A agregação física dos
insumos, como já afirmado, não é requerida.
Aliás, as discussões propostas no sentido de que os
combustíveis e lubrificantes não poderiam ser considerados insumos porque
não se agregam a qualquer produto durante o processo produtivo ou de que a
prestação de serviços de transportes se daria por parte da empresa para si
mesma me parecem de todo inadequadas. Primeiro porque não se pode
exigir creditamento físico de empresas que atuam no setor de serviços, já
que não fabricam nada. Segundo porque a discussão sobre quem presta o
serviço de transportes para quem é inócua, pois, além de depender do que
dispõe o contrato de compra e venda (se está incluso ou não o preço do
transporte - art. 490, CC⁄2002), no campo econômico o transporte sempre
representa custo (econômico) para a empresa transportadora que ela repassa
implícita ou explicitamente no preço final que cobra de seus clientes,
destacado ou não na fatura. Não por outro motivo que o frete na operação
de venda quando o ônus for suportado pelo vendedor foi considerado custo
apto a gerar créditos de PIS⁄COFINS não-cumulativas, in verbis:
Art. 3o Do valor apurado na forma do art. 2o a
pessoa jurídica poderá descontar créditos calculados em relação
a: (Produção de
efeito) (Vide Medida Provisória
nº 497, de 2010) (Regulamento)
[...]
IX - armazenagem de mercadoria e frete na
operação de venda, nos casos dos incisos I e II, quando o
ônus for suportado pelo vendedor.
[...]
Decerto, houvesse cláusula contratual definindo que
as despesas da tradição (frete) estariam a cargo do comprador,
juridicamente haveria clara prestação de serviços de transportes por parte
da vendedora. No entanto, economicamente, tal é indiferente para
a composição do custo e do valor agregado, que é o que nos interessa na
tributação não-cumulativa.
Com efeito, a vedação do creditamento em casos como
o presente teria por únicos efeitos (a) forçar a empresa vendedora⁄transportadora
a registrar em cláusula contratual que as despesas da tradição (frete)
estariam a cargo do comprador, fornecendo a ele o serviço, ou
(b) terceirizar a atividade de transporte de suas mercadorias para uma
outra empresa que possivelmente seria criada dentro de um mesmo grupo
econômico apenas para se fazer planejamento tributário, com renovados
custos burocráticos (custos de conformidade à legislação tributária,
empresarial e trabalhista para a criação de uma nova empresa). Não vislumbro
qualquer ganho social, econômico e de tributação aparente nessas duas
iniciativas que as tornem melhores e mais desejáveis que a atual situação
da empresa nos autos.
Para concluir, registro que o presente caso é
inédito, pois em tudo difere do julgado no AgRg no REsp 1335014 ⁄ CE
(Segunda Turma, Rel. Min. Castro Meira, julgado em 18.12.2012) e no REsp
1147902 ⁄ RS (Segunda Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em
18.03.2010), onde enfrentado o creditamento de PIS⁄COFINS pelas despesas de
frete entre estabelecimentos de uma mesma empresa, e do REsp 1215773 ⁄ RS
(Primeira Seção, Rel. Min. Benedito Gonçalves, Rel. p⁄acórdão Min. César
Asfor Rocha, julgado em 22.08.2012), onde se discutiu o creditamento
quando, na operação de venda ao consumidor final, o frete incide no
transporte do veículo da fábrica para a concessionária a fim de
ser entregue ao consumidor final.
Dessa forma, considero que todos os pressupostos
para o creditamento estão presentes: trata-se de combustíveis,
lubrificantes e peças utilizados na prestação de serviços de transportes,
serviços estes componentes do objeto social da empresa e cujo custo
é transferido para o elo subsequente na cadeia econômica e cujo
faturamento sofre a tributação pelas contribuições ao PIS e COFINS
não-cumulativas.
Ante o exposto, COM AS VÊNIAS DE PRAXE, DIVIRJO DO
RELATOR PARA DAR PROVIMENTO ao recurso especial.
Por derradeiro o Ministro Humberto
Martins, também se posiciona nos mesmos parâmetros do voto-vogal do Ministro Cesar
Asfor Rocha nos termos parcialmente
transcritos:
“Recurso especial
proveniente de ação mandamental, na qual se pleiteia o aproveitamento
como crédito dedutível da base de cálculo do PIS e da COFINS, nas
despesas e custos inerentes à aquisição de combustíveis, lubrificantes e peças
de reposição utilizados em veículos que realizam a entrega de suas
mercadorias.
O Tribunal Regional
Federal da 4ª Região deu provimento à apelação interposta pela UNIÃO
reconhecendo a impossibilidade do alargamento do conceito de
insumos.
Para o acórdão recorrido "as
leis que instituíram o PIS e a COFINS não cumulativos apenas
autorizam a apropriação de créditos calculados era relação a bens
e serviços utilizados como "insumos" na fabricação de produtos
destinados à venda, sem explicitar qual o alcance desse termo.
Contudo, isso não significa que se possa caracterizar como insumo todos os
elementos, inclusive os indiretos, necessários à produção de produtos e
serviços, como mão de obra energia elétrica."
Nesse contexto, deve ser entendido
por insumo "cada um dos elementos imprescindíveis para a
produção de mercadorias ou para a prestação de serviços, desde que intrínsecos
à atividade das empresas". Daí porque não podem
ser considerados insumos os gastos ou despensas com combustíveis,
lubrificantes e peças de reposição de veículos utilizados para o
transporte de mercadorias vendidas pela empresa.
“Mantenho o
entendimento adotado no julgamento do REsp 1.246.317⁄MG”.
“A Lei n. 10.833, de
2003, teve por escopo transformar o PIS e a COFINS em tributos não
cumulativos; para tanto, alterou a hipótese de incidência tributária,
permitido que o contribuinte exclua da contribuição devida os
créditos, entre outros, referentes à energia elétrica ou térmica, aluguéis
de prédios, máquinas e edificações utilizados nas atividades da empresa,
nos termos do que estabelece o art. 3º, verbis:
"Art.
3º Do valor apurado na forma do art. 2º a pessoa jurídica
poderá descontar créditos calculados em relação a:
I
- bens adquiridos para revenda, exceto em relação às mercadorias
e aos produtos referidos: (Redação dada pela Lei nº 10.865, de 2004)
a)
no inciso III do § 3º do art. 1º desta Lei; e (Redação dada pela Lei
nº 11.727, de 23 de junho de 2008)
b)
no § 1º do art. 2º desta Lei; (Incluído pela Lei nº 10.865, de 2004)
b)
nos §§ 1º e 1º-A do art. 2º desta Lei; (Redação dada pela Lei nº 11.787,
de 25 de setembro de 2008)
II
- bens e serviços, utilizados como insumo na prestação de serviços
e na produção ou fabricação de bens ou produtos destinados à venda, inclusive
combustíveis e lubrificantes, exceto em relação ao pagamento de que
trata o art. 2º da Lei n. 10.485, de 3 de julho de 2002, devido
pelo fabricante ou importador, ao concessionário, pela intermediação ou
entrega dos veículos classificados nas posições 87.03 e 87.04 da TIPI;
(Redação dada pela Lei nº 10.865, de 2004)
III
- energia elétrica e energia térmica, inclusive sob a forma de
vapor, consumidas nos estabelecimentos da pessoa jurídica; (Redação dada
pela Lei nº 11.488, de 15 de junho de 2007)
IV
- aluguéis de prédios, máquinas e equipamentos, pagos a pessoa jurídica,
utilizados nas atividades da empresa;
V
- valor das contraprestações de operações de arrendamento mercantil de
pessoa jurídica, exceto de optante pelo Sistema Integrado de Pagamento
de Impostos e Contribuições das Microempresas e das Empresas de
Pequeno Porte - SIMPLES; (Redação dada pela Lei nº 10.865, de 2004);
VI
- máquinas, equipamentos e outros bens incorporados ao ativo imobilizado,
adquiridos ou fabricados para locação a terceiros, ou para utilização na
produção de bens destinados à venda ou na prestação de serviços; (Redação
dada pela Lei nº 11.196, de 2005)
VII
- edificações e benfeitorias em imóveis próprios ou de
terceiros, utilizados nas atividades da empresa;
VIII
- bens recebidos em devolução cuja receita de venda tenha integrado
faturamento do mês ou de mês anterior, e tributada conforme o disposto
nesta Lei;
IX
- armazenagem de mercadoria e frete na operação de venda, nos casos dos
incisos I e II, quando o ônus for suportado pelo vendedor.
X
- vale-transporte, vale-refeição ou vale-alimentação, fardamento
ou uniforme fornecidos aos empregados por pessoa jurídica que explore
as atividades de prestação de serviços de limpeza, conservação e
manutenção. (Incluído pela Lei nº 11.198, de 8 de janeiro de 2009)
(...)
§
10. O valor dos créditos apurados de acordo com este artigo não constitui
receita bruta da pessoa jurídica, servindo somente para dedução
do valor devido da contribuição." (Grifo
meu).
“O regime não
cumulativo das contribuições utiliza técnica distinta da aplicada ao IPI e
ao ICMS, porquanto, nestes tributos, a não cumulatividade
representa crédito corresponde ao valor do imposto devido, pela entrada da
mercadoria ou insumo no estabelecimento, que será compensado na saída da
mercadoria. Por sua vez, a não cumulatividade do PIS e da COFINS trata-se
de crédito a ser deduzido da contribuição devida, ou seja, possibilita a
apropriação das contribuições incidentes sobre insumos utilizados no
processo produtivo, as quais são deduzidas das contribuições a recolher”.
“No caso em tela, e
conforme destacado pelo eminente Ministro César Asfor Rocha em seu voto
divergente, é incontroverso o fato de que é do objeto social da empresa o
transporte rodoviário de cargas; de modo que o pleito vinculado
na presente demanda diz respeito apenas creditamento de PIS e COFINS sobre
aquisições de combustíveis, lubrificantes e peças de reposição "utilizados
nos veículos de entrega das mercadorias"”.
“Em meu sentir, no
caso em exame, o conceito de insumo deve ser abranger as aquisições de
combustíveis, lubrificante e peças de reposição, sob pena de criarmos
um discrimen anti-isonômico; na medida em que a empresa
transportadora pode creditar-se do PIS e da COFINS incidentes sobre os
mencionados insumos. Assim, se empresa prestar o serviço de entrega não
poderá beneficiar-se do referido crédito. Daí porque o simples fato de a
empresa realizar - ela própria - o transporte não pode ser empecilho para
o creditamento”.
“Não é razoável que
não cumulatividade do PIS e a COFINS somente seja utilizada em situações
em que a empresa contrate serviço de transporte de terceiros, sob pena de
violação do art. 150, II, da CF⁄88”.
“Ante o exposto, com
a devida vênia do eminente Ministro Relator, acompanho a divergência
inaugurada pelo Ministro Cesar Asfor Rocha para dar provimento ao recurso
especial”.
Importante salientar que
a tese vencedora torna-se emblemática na medida em que é a primeira vez que o
judiciário reconhece o direito ao crédito do PIS e da COFINS Não Cumulativos de
combustíveis, lubrificantes e peças de reposição utilizadas no serviço de transporte
próprio de mercadorias vendidas por comerciante atacadista; onde os custos dos
serviços prestados encontram-se intrinsecamente agregados ao valor da venda.
Esperamos que a tese
divergente do presente julgado torne-se paradigma
jurisprudencial aliviando a carga tributária insuportável a que os
contribuintes estão sujeitos.