I.
Aspectos
Tributários – Art. 155, I CF.
1. Competência, Instituição e Abrangência
O
Art. 155, I da Carta Magna, estabelece que:
Art. 155.
Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:
I - transmissão causa mortis e doação, de quaisquer bens ou direitos;
Portanto, o ITCMD abrange a transmissão causa mortis, daí ser chamado comumente de imposto sobre a herança, bem como, sobre as doações, ou seja, aquelas transmitidas a título não oneroso, gratuito; e em ambos os casos abrangerá quaisquer bens ou direitos.
2. Lacuna Regulatória – Ausência de Lei Complementar
2.1 Descompasso Temporal e Normativo
Com
a promulgação da Carta Política Constitucional em 05.10.1988, o Art. 24, I, §§
1º a 4º estabeleceu o Princípio da Concorrência Tributária, isto é, a União,
entes federados e o Distrito Federal poderão legislar concorrentemente em
matéria tributária; além disso, a concorrência da União está limitada a estabelecer
normas gerais e os Estados deverão se valer da sua competência suplementar; bem
como, na falta de normas gerais de âmbito federal, os Estados poderão exercer
competência plena para legislar, atendendo suas particularidades; e por fim,
advindo normatização federal, cessará os efeitos das normas gerais criadas
pelos Estados, naquilo que for incompatível com aquela.
O
artigo precedente foi ratificado pelos §§ 3º e 4º do art. 34 do ADCT – Ato das
Disposições Constitucionais Transitórias, determinando que:
“Art. 34. O sistema tributário nacional entrará em vigor a
partir do primeiro dia do quinto mês seguinte ao da promulgação da
Constituição, mantido, até então, o da Constituição de 1967, com a redação dada
pela Emenda nº 1, de 1969, e pelas posteriores.”
..................................................................................
“§
3º - Promulgada a Constituição, a União, os
Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão editar as leis necessárias
à aplicação do sistema tributário nacional nela previsto.”
§ 4º - As leis editadas nos termos do parágrafo anterior
produzirão efeitos a partir da entrada em vigor do sistema tributário nacional previsto
na Constituição.
O art. 34, § 5º do ADCT, por sua vez, inaugurou
o Princípio da Recepção do Sistema Tributário, assegurando a aplicação da legislação
anterior, naquilo que não seja incompatível com a norma tributária e com a
legislação editada nos termos §§ 3º e 4º acima mencionados.
Mediante
este cenário normativo constitucional e sob a égide do Princípio da Recepção, a
Lei nº
5.172, de 25 de Outubro de 1966, publicada em 27.10.1966, que criou o Código Tributário Nacional – CTN
e alçada ao status de lei complementar, trouxe em seu bojo, o art. 35 e seguintes
que dispõe sobre as hipóteses de incidência do “Impôsto
sôbre a Transmissão de Bens Imóveis e de Direitos a êles Relativos” – ITBID.
O art. 35, assim
dispõe: “O impôsto, de competência dos Estados, sôbre a transmissão de bens
imóveis e de direitos a êles relativos tem como fato gerador:”
Note que o imposto é
de competência dos Estados e incide sobre a transmissão de bens imóveis e de
direitos a eles relativos, portanto, o texto está desassociado da norma constitucional
promulgada em 1988.
Com a ruptura do Sistema
Tributário, a Carta Magna de 1988, promoveu cisão estrutural ao criar o ITCMD –
Imposto sobre a Transmissão Causa Mortis e
Doação e de quaisquer
bens ou direitos de competência Estadual (art.
155, I) e o ITBI – Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis e sobre direitos
reais - oneroso e inter vivos - de natureza municipal (156, II).
Esta bifurcação tornou
incompatível, nos termos do Art. 34, § 5º do ADTC da Constituição Federal, a
aplicação do art. 35 e seguintes do CTN ao ITCMD.
Em
face dessa lacuna entre o novel sistema tributário e o regulado pelo CTN - editado,
aliás, 22 anos antes da promulgação da atual Carta Constitucional -, e por não
existir norma geral federal prevista no art. 24 I, § 1º; o art. 24, I § 3º
combinado com o Art. 34, §§ 3º e 4º do ADTC, autorizou os Estados e o
Distrito Federal editar suas próprias leis e de acordo com suas peculiaridades;
todavia, ressaltou que, advindo norma federal naquilo que for incompatível com
a norma estadual, cessará os efeitos desta.
Portanto, com base em tais premissas, os Estados criaram as suas respectivas leis regulamentadoras do ITCMD.
2.2 – A Doutrina
Neste
mesmo sentido, diz Leandro Paulsen[1]
“À luz da Constituição anteriores, aos Estados era outorgada competência para
instituição de imposto sobre a transmissão, a qualquer título, de bens imóveis
e direitos reais, sendo estabelecido pelo CTN seus fatos geradores,
contribuintes e base de cálculo, inclusive no que se refere à transmissão
“causa mortis”. Contudo, a Constituição de 1988 inova ao autorizar a imposição
tributária sobre a transmissão causa
mortis e doação “de qualquer bens e direitos”, o que enseja não apenas a
tributação da transmissão de bens móveis como, também, a tributação dos
chamados intangíveis.”
“Portanto, os artigos 35 a
42 do Código Tributário Nacional (CTN), editados antes da Constituição Federal
de 1988, limitam-se a regular a transmissão, a qualquer título, inclusive causa mortis, de bens imóveis e direitos
reais sobre eles, conforme definido na legislação civil. Esses dispositivos não
abrangem a transmissão causa mortis e doação de “quaisquer bens ou direitos”,
como previsto no artigo 155, I, da CF/88. Na ausência de lei complementar que
discipline a tributação de bens móveis e intangíveis, os Estados e o Distrito
Federal exercem, atualmente, competência legislativa plena para regulamentar a
incidência do ITCMD sobre esses bens.”
Corroborado
com este entendimento Leandro Paulsen[2] traz a seguinte citação:
“Não
existindo lei complementar dispondo sobre normas gerais para os impostos sobre
transmissão causa mortis e doação de
bens móveis, os Estados-membros e o Distrito Federal podem legislar, por serem
detentores da competência impositiva e também em razão da autorização contida
no art. 34, §§ 3º à 5º, do ADCT e no art. 24, e parágrafos da CF. (FERNANDES,
Regina Celi Pedrotti Vespero – Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e doação – ITCMD. RT. 2002 p. 59/60
2.3 Projeto de Lei Complementar Federal – Normas Gerais –
Tramitação nas Casas Legislativas.
Passados
quase 37 anos da promulgação na Constituição Federal de 1988, a lei
complementar regulamentadora das normas gerais do ITCMD ainda não foi editada. Porém,
em virtude da Reforma Tributária ocorrida no final de 2023, há em tramitação nas
Casas Legislativas da Câmara do Deputados e do Senado Federal o Projeto de Lei
Complementar - PLP
108/24 de autoria do Poder Executivo, onde “ Institui o Comitê Gestor do Imposto sobre Bens e
Serviços (CG-IBS); dispõe sobre o
processo administrativo tributário relativo ao lançamento de ofício do
Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), sobre a distribuição do produto da
arrecadação do IBS aos entes federativos e sobre
o Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou
Direitos (ITCMD); altera as Leis nºs 5.172, de 25 de outubro de 1966 (Código
Tributário Nacional), 1.079, de 10 de abril de 1950, e 14.113, de 25 de
dezembro de 2020, as Leis Complementares nºs 63, de 11 de janeiro de 1990, 87,
de 13 de setembro de 1996, 123, de 14 de dezembro de 2006, e 141, de 13 de
janeiro de 2012, e o Decreto nº 70.235, de 6 de março de 1972.
O
ITCMD está previsto no projeto de lei complementar a partir do Livro II e
compreende os artigos 159 a 189.
2.3.1 – Status da Tramitação do Projeto de
Lei Complementar
Por
tratar-se de Projeto de Lei Complementar é necessário a apreciação Bicameral,
isto é, da Câmara dos Deputados e do Senado Federal (art. 61 e seguintes CF).
O PLP
108/24, foi apresentado em 05.06.2024 pelo Poder Executivo à Câmara dos Deputados,
sendo aprovada a redação final em 30.10.2024.
A Câmara
em 08.11.24, enviou o texto aprovado ao Senado
Federal, cujo recebimento ocorreu em 12.11.2024.
Atualmente
o projeto se encontra na CCJ - Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania.
2.3.2 – Urgência na Regulamentação do
ITCMD
A
iniciativa legislativa em curso confirma o
reconhecimento institucional da
necessidade de regulamentação específica, após décadas de funcionamento do
tributo sem normas gerais uniformes, o que contribui, e muito, na insegurança
jurídica relativamente aos atos práticos que envolvem este imposto.
A
lacuna compromete, ainda, a coerência do sistema tributário nacional, violando os
princípios constitucionais da isonomia e uniformidade tributária, além de
prejudicar a eficiência arrecadatória dos Estados.
Continua...
[1]
Direito Tributário, Constituição e Código Tributário à Luz da Doutrina e da
Jurisprudência, 10º Ed, 2008, Livraria do Advogado Editora, pag. 338.
[2] Direito Tributário, Constituição e Código Tributário à Luz da Doutrina e da Jurisprudência, 10º Ed, 2008, Livraria do Advogado Editora, pag. 338 e 339
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