20/01/2015

PIS/COFINS NÃO CUMULATIVIDADE – COMERCIANTE ATACADISTA - CREDITAMENTO - COMBUSTÍVEIS, LUBRIFICANTES E PEÇAS UTILIZADAS COMO INSUMOS NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE ENTREGA DE MERCADORIAS VENDIDAS PELA PRÓPRIA EMPRESA. POSSIBILIDADE.

Recentemente os Ministros da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça julgou o RECURSO ESPECIAL Nº 1.235.979 - RS (2011⁄0023711-3) de relatoria do ministro Herman Benjamin e designado relator para o acórdão o ministro Mauro Campbell Marques, cuja recorrente é a empresa Johann Alimentos Ltda e recorrida a Fazenda Nacional, manifestando favoravelmente ao crédito de alguns insumos para composição da base de calculo das contribuições do PIS e da COFINS conforme ementa a seguir:

EMENTA

TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÕES AO PIS E COFINS NÃO CUMULATIVAS. CREDITAMENTO. COMBUSTÍVEIS, LUBRIFICANTES E PEÇAS UTILIZADOS COMO INSUMOS NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE ENTREGA DE MERCADORIAS VENDIDAS PELA PRÓPRIA EMPRESA. ARTS. 3º, II, DAS LEIS N. N. 10.637⁄2002 E 10.833⁄2003.

1. O creditamento pelos insumos previstos no art. 3º, II, da Lei n. 10.833⁄2003 e da Lei n. 10.637⁄2002 abrange os custos com peças, combustíveis e lubrificantes utilizados por empresa que, conjugada com a venda de mercadorias, exerce também a atividade de prestação de serviços de transporte da própria mercadoria que revende.

2. Recurso especial provido.

A síntese da controvérsia diz respeito a “Hipótese em que a empresa, comerciante de gêneros alimentícios, defende a possibilidade de obtenção de créditos de PIS e COFINS sobre aquisição de combustíveis, lubrificantes e peças de reposição utilizados em veículos dos quais faz uso para entrega de mercadorias por ela comercializadas”.

Em seu voto, o Ministro relator Herman Benjamin tece algumas considerações no que tange aos aspectos constitucionais do regime não cumulativo do PIS/COFINS e o princípio constitucional da estrita legalidade em matéria de exoneração fiscal dizendo que “Ao tratar da não cumulatividade aplicável ao IPI e ao ICMS,  a Constituição Federal determina que tais tributos devam ser não cumulativos, compensando-se o que for devido em cada operação com o montante cobrado nas anteriores (arts. 153, § 3°, II, e 155, § 2°, I)”.
“A norma constitucional impõe comando a ser observado pelo legislador infraconstitucional, que deve necessariamente disciplinar a compensação do valor devido na operação com aquele cobrado na anterior”.
“Diversamente, no tocante à instituição do regime não cumulativo do PIS e da COFINS, o legislador constituinte derivado (EC 42⁄2003) outorgou à discricionariedade do legislador infraconstitucional a disciplina da matéria, inclusive para efeito de definir os setores da atividade econômica a serem alcançados por essa sistemática (art. 195, § 12)”.
“E não poderia ser de outra forma; afinal, a aplicação da não cumulatividade visa à obtenção de neutralidade fiscal em hipóteses de tributação plurifásica, o que, por excelência, se verifica nas exações incidentes sobre operações de circulação de bens e serviços”.
A rigor, portanto, não há verdadeiramente cumulatividade a ser evitada na tributação da receita.
“Em recente julgado, a Primeira Turma do STF assentou que “A previsão de estabelecimento de diferentes regimes tributários pela Lei nº 10.6372002, de modo a limitar deduções da base de cálculo do PIS e da COFINS a determinado grupo de empresas, não implica ofensa ao princípio da isonomia”. Não cabe ao judiciário imiscuir-se no mérito das decisões políticas adotadas pelo legislador e pela Administração tributária" (AI 837957 AgR, Relator:  Min. Roberto Barroso, Primeira Turma, DJe-094, 19.5.2014)”.
“Claro está que o legislador infraconstitucional pode limitar a apuração de créditos do PIS e da COFINS não cumulativos”.
“Acrescente-se que o art. 150, § 6°, da Constituição Federal impede que qualquer subsídio ou isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, relativos a impostos, taxas ou contribuições, seja concedido sem lei específica, federal, estadual ou municipal, que regule exclusivamente as matérias acima enumeradas ou o correspondente tributo ou contribuição, sem prejuízo do disposto no art. 155, § 2.º, XII, g”.
“Em outras palavras, não cabe ao legislador conceder exoneração fiscal genérica, tampouco ao intérprete ampliar o benefício concedido. Normas excepcionais devem ser interpretadas restritivamente, conforme clássica regra hermenêutica”.
“Penso, portanto, que, a prevalecer orientação contrária, vulneram-se as normas constitucionais acima descritas”.

O eminente relator trata ainda dos limites da causa de pedir inicial e a divergência inaugurada pelo ministro Cesar Asfor Rocha (aposentado) manifestando que “Saliente-se que, como expressamente atestou o Tribunal a quo e foi confirmada pelo advogado da recorrente na bem exposta sustentação oral proferida na sessão de 10.5.2011, embora conste no contrato social da empresa que ela presta  serviço de transporte de cargas, o benefício pretendido na presente demanda envolve unicamente os produtos utilizados na entrega das mercadorias próprias, ou seja, empregados na atividade de simples comercialização de alimentos”.
“Nesse ponto, peço vênia ao eminente Ministro Cesar Asfor Rocha para divergir de seu judicioso voto divergente e para manter meu entendimento”.
“Sua Excelência deu relevância ao fato de constar como objeto social da recorrente o transporte rodoviário de cargas em geral. Sucede que o juiz não pode se afastar da causa de pedir inicial, sob pena de incorrer em julgamento extra petita. E a causa de pedir inicial não se refere à prestação de serviços de transporte rodoviário, mas unicamente à venda de produtos, incluindo a subsequente entrega com o emprego de veículos da empresa vendedora”. Confira-se:
 “A presente demanda visa afastar a proibição imposta pela Autoridade Coatora de a empresa se creditar dos valores de PIS e da COFINS sobre a aquisição de combustíveis, lubrificantes e peças de reposição utilizados pelos veículos que servem exclusivamente para entrega dos produtos vendidos pela empresa (fl. 4, e-STJ)”.

Ainda o relator do processo, caminha esclarecendo sobre a irrelevância do conceito de insumo para o caso concreto e quanto às atividades que permitem a dedução de insumos: prestação de serviços e produção ou fabricação de bens ou produto nos seguintes termos: “Nesse contexto, parece-me irrelevante para a resolução da controvérsia o conceito de insumo no regime das Leis 10.637⁄2002 e 10.833⁄2003”.
“Essas leis instituíram o regime não cumulativo para o PIS e a COFINS, permitindo que o contribuinte pudesse deduzir do valor a pagar, a título das contribuições, créditos referentes a "bens e serviços, utilizados como insumo na prestação de serviços e na produção ou fabricação de bens ou produtos destinados à venda". “Confira-se”:

“Art. 3º. Do valor apurado na forma do art. 2o a pessoa jurídica poderá descontar créditos calculados em relação a”:
(...)
“II - bens e serviços, utilizados como insumo na prestação de serviços e na produção ou fabricação de bens ou produtos destinados à venda, inclusive combustíveis e lubrificantes, exceto em relação ao pagamento de que trata o art. 2° da Lei no 10.485, de 3 de julho de 2002, devido pelo fabricante ou importador, ao concessionário, pela intermediação ou entrega dos veículos classificados nas posições 87.03 e 87.04 da TIPI; (Redação dada pela Lei nº 10.865, de 2004)”

“A norma é clara ao dispor que os insumos que propiciam ao contribuinte a obtenção de créditos estão relacionados à prestação de serviços ou industrialização”.
“Dessa forma, independentemente do conceito que se dê a insumo, a atividade desenvolvida pela recorrente – simples comercialização de mercadorias, que não pode ser considerada prestação de serviços ou industrialização – não foi contemplada pelo legislador, de forma que não gera créditos de PIS e COFINS na forma do art. 3º da Lei 10.637⁄2002 e da Lei 10.833⁄2003”.
“Não se pode equiparar os atos relativos à tradição do bem comercializado à prestação de um serviço. De acordo com o art. 490 do CC, "Salvo cláusula em contrário, ficarão as despesas de escritura e registro a cargo do comprador, e a cargo do vendedor as da tradição". A regra, portanto, é de que as despesas com a tradição fiquem por conta do comerciante, razão pela qual a entrega do produto na execução do contrato de compra e venda não configura prestação de serviço”.
“Nesse ponto, é preciso ressaltar que pouco importa, para o deslinde da controvérsia travada na presente demanda, o entendimento da Segunda Turma do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais – CARF, no sentido de alargar o conceito de insumo”.
“Isso porque, como muito bem lembrado pelo e. Min. Mauro Campbell na sessão de 10.5.2011 – motivo do meu pedido de vista regimental –, o CARF, ao proferir o acórdão 3202-00.226, no julgamento do Recurso Voluntário 369.519, interposto por Móveis Ponzani Ltda., entendeu que o conceito de insumo relacionado às hipóteses de creditamento de PIS e COFINS não pode ser o mesmo utilizado para o IPI, sendo aquele bem mais amplo”.
“No caso, o CARF, analisando o recurso da fabricante de móveis, conferiu ao conceito de insumo uma perspectiva mais ampla, para abranger todos os custos e despesas operacionais da pessoa jurídica, mas sempre tendo como premissa que a empresa dedica-se à industrialização ou à prestação de serviços, que, como visto acima, são as atividades que proporcionam a obtenção de crédito, nos termos do art. 3º das Leis 10.637⁄02 e 10.833⁄03. É o que se extrai do voto proferido pelo Conselheiro Relator no mencionado julgamento”:

(...)
“Por outro lado, no âmbito de PIS⁄COFINS a referência explícita é a "produção ou fabricação", vale dizer, às ATIVIDADES e PROCESSOS de produzir ou fabricar, de modo que a partir deste referencial deverá ser identificado o universo de bens e serviços e reputados seus respectivos insumos”.
 “Assim, em verdade, embora não tenha analisado a mesma questão, já que, como afirmado, para o deslinde da presente controvérsia pouco importa o conceito que se dê a insumo, o entendimento do CARF corrobora a tese ora defendida, pois parte da premissa – aqui reafirmada – de que as atividades que geram créditos de PIS e COFINS restringem-se à industrialização e à prestação de serviços”.
Sustenta, ainda, a impossibilidade de equiparar prestação de serviço a atividades vinculadas à tradição reafirmando que “Por outro lado, como afirmado anteriormente, o fato de a empresa realizar as entregas dos produtos que ela comercializa não descaracteriza a natureza de suas atividades. Não há, aqui, elemento algum que possa ser considerado como industrialização ou prestação de serviços, a fim de possibilitar o creditamento”.
“Ademais, não se pode confundir a situação de um contribuinte que contrata outro para prestar o serviço de frete com a daquele que faz a própria entrega das mercadorias que vende”.
“Na primeira hipótese, há um terceiro na cadeia e, para não onerá-la demasiadamente, permite-se que o vendedor credite-se de PIS e COFINS sobre o frete. Por outro lado, a empresa transportadora arcará com o custo das contribuições sobre o valor da prestação de seu serviço (descontando os créditos decorrentes dos insumos utilizados em sua atividade)”.
“Já quando o próprio vendedor faz a entrega, a cadeia é menor e, consequentemente, há menos etapas a serem tributadas, daí por que não se autoriza o creditamento”.
Por derradeiro, na sustentação de seu voto o Ministro relator Herman Benjamin para negar provimento ao Recurso Especial e como consequência o não direito aos créditos pretendidos pela recorrente trata da interpretação estrita em matéria de creditamento fiscal colacionando, inclusive uma série de julgados da Corte Superior do STJ, reproduzido parcialmente.
Diz o Ministro: “Convém destacar que esta Corte Superior já firmou o entendimento de que somente é possível a obtenção de créditos decorrentes da não cumulatividade quando houver previsão legal e de que é admissível ao legislador estabelecer restrições ao creditamento”. “Confiram-se”:

TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL. PIS E OFINS. LEIS 10.637⁄2002 E 10.833⁄2003. REGIME DA NÃO CUMULATIVIDADE. DESPESAS DE FRETE. TRANSFERÊNCIA INTERNA DE MERCADORIAS ENTRE ESTABELECIMENTOS DA MESMAEMPRESA. CREDITAMENTO. IMPOSSIBILIDADE. INTERPRETAÇÃO LITERAL.
1. Consoante decidiu esta Turma, "as despesas de frete somente geram crédito quando relacionadas à operação de venda e, ainda assim, desde que sejam suportadas pelo contribuinte vendedor". Precedente.
2. O frete devido em razão das operações de transportes de produtos acabados entre estabelecimento da mesma empresa, por não caracterizar uma operação de venda, não gera direito ao creditamento.
3. A norma que concede benefício fiscal somente pode ser prevista em lei específica, devendo ser interpretada literalmente, nos termos do art. 111 do CTN, não se admitindo sua concessão por interpretação extensiva, tampouco analógica. Precedentes.
4. Agravo regimental não provido.
(AgRg no REsp 1335014⁄CE, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, DJe 8⁄2⁄2013).

PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. RECURSO ORDINÁRIO. TEORIA DA CAUSA MADURA. POSSIBILIDADE. AQUISIÇÃO DE BENS DESTINADOS AO ATIVO FIXO. LIMITAÇÕES LEGAIS AO CREDITAMENTO DE ICMS. CONSTITUCIONALIDADE E LEGALIDADE.
1. Na ação mandamental, a impetrante pretende ser autorizada a compensar crédito de ICMS oriundo da aquisição de bens destinados ao ativo permanente, uso e consumo da impetrante, bem como quanto à aquisição de energia elétrica e serviços de comunicação, sem a incidência das restrições qualitativas e temporais impostas pelas Leis Complementares nºs 99⁄1999, 102⁄2000.
2. Desnecessária a remessa dos autos ao Tribunal a quo, pois há que ser aplicado o princípio da causa madura, por envolver matéria exclusivamente de direito, nos termos do art. 515, § 3º, do CPC.
3. É possível o creditamento de ICMS na aquisição de bens destinados ao ativo fixo após a vigência da Lei Complementar 87⁄96. Entretanto, não há ilegalidade ou inconstitucionalidade nas restrições qualitativas e temporais estabelecidas por Leis Complementares posteriores ( 92⁄97, 99⁄99 e 102⁄2000).
4. Recurso ordinário em mandado se segurança não provido.
(RMS 19.658⁄CE, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, DJe 27⁄11⁄2009).

Por sua vez, o Ministro Cesar Asfor Rocha (aposentado) em seu voto-vogal divergiu do entendimento do ministro relator se pronunciando da seguinte forma:

“Sr. Presidente, com o devido respeito, vou votar divergindo do eminente Ministro Relator”.
“Não há dúvida, quanto à configuração fática, de que a empresa, além de ser distribuidora de alimentos, tem em seu objeto social, como parte dos objetivos, o transporte rodoviário de cargas em geral. Evidentemente, há uma maior razão para distribuir a mercadoria que ela própria vende que é uma opção que ela fez. Outras empresas podem terceirizar essa entrega da mercadoria”.
“Sem dúvida nenhuma, essa atividade integra o insumo da própria empresa. Os precedentes que foram trazidos pelo eminente Relator, pelo que pude rapidamente verificar pelo nosso sistema de informática, não se ajustam ao caso ora em debate, eles se reportam a hipóteses desassemelhadas das que ora se cogita. Por isso, entendo que, no caso das aquisições de combustíveis, lubrificantes e peças de reposição, como aqui pontuado pela recorrente, ocorre, como a própria recorrente referenciou, o fenômeno peculiar que justifica o creditamento pretendido”.
“Por essa razão, com o devido respeito, divirjo do voto do eminente Relator para conhecer do recurso especial e dar-lhe provimento, conforme o postulado pela recorrente.”

De outra parte, o ministro Mauro Campbell Marques designado relator do presente acórdão manifesta seu voto na mesma linha da divergência inaugurada pelo Ministro Asfor dizendo:

“Com efeito, o art. 3º, da Lei n. 10.833⁄2003, registra expressamente que a pessoa jurídica poderá descontar créditos calculados em relação aos bens adquiridos para revenda (art. 3º, I) e aos bens e serviços utilizados como insumo na prestação de serviços e na produção ou fabricação de bens ou produtos destinados à venda, inclusive combustíveis e lubrificantes (art. 3º, II). Transcrevo:
Art. 3o Do valor apurado na forma do art. 2o a pessoa jurídica poderá descontar créditos calculados em relação a:      (Produção de efeito)        (Vide Medida Provisória nº 497, de 2010)   (Regulamento)
I - bens adquiridos para revenda, exceto em relação às mercadorias e aos produtos referidos:      (Redação dada pela Lei nº 10.865, de 2004)
a) nos incisos III e IV do § 3o do art. 1o desta Lei; e       (Incluído pela Lei nº 10.865, de 2004)(Vide Medida Provisória nº 413, de 2008)       (Vide Lei nº 11.727, de 2008).
b) nos §§ 1o e 1o-A do art. 2o desta Lei;       (Redação dada pela lei nº 11.787, de 2008)       (Vide Lei nº 9.718, de 1998)
II - bens e serviços, utilizados como insumo na prestação de serviços e na produção ou fabricação de bens ou produtos destinados à venda, inclusive combustíveis e lubrificantes, exceto em relação ao pagamento de que trata o art. 2o da Lei no 10.485, de 3 de julho de 2002, devido pelo fabricante ou importador, ao concessionário, pela intermediação ou entrega dos veículos classificados nas posições 87.03 e 87.04 da Tipi; (Redação dada pela Lei nº 10.865, de 2004)
[...]
A menção expressa feita na lei aos "bens adquiridos para revenda" traz para dentro do sistema não-cumulativo as empresas cuja principal atividade é a comercialização de mercadorias, como a recorrente JOHANN ALIMENTOS LTDA., que também atua nos ramos de importação de alimentos, comércio atacadista de alimentos, comércio varejista de alimentos, transporte rodoviário de cargas e exportação de alimentos (...). Já a alusão aos "bens e serviços utilizados como insumo na prestação de serviços" traz para dentro do sistema não-cumulativo as empresas cuja principal atividade é a prestação de serviços e, por fim, quando se menciona os "bens e serviços utilizados como insumo na produção ou fabricação de bens ou produtos", a situação de não-cumulatividade abrange o setor industrial.
Desse modo, todas as etapas do ciclo produtivo (1ª etapa: estabelecimento fabricante ou importador; 2ª etapa: estabelecimento distribuidor atacadista, 3ª etapa: estabelecimento comerciante varejista) são gravadas pelas contribuições ao PIS⁄COFINSnão-cumulativas e todas essas etapas são, por isso, capazes de gerar créditos.
Aliás, é da própria essência dos tributos não-cumulativos que incidam sobre mais de uma etapa do circuito econômico, pois só assim restará caracterizada a plurifasía. Sendo assim, com todas as vênias ao Min. Herman Benjamin, o fato de a empresa recorrente JOHANN ALIMENTOS LTDA. atuar no ramo do comércio atacadista é indiferente para a solução desta demanda. O que importa aqui saber é se, conjugada com essa venda de mercadorias, a empresa exerce também a atividade de prestação de serviços de transporte da própria mercadoria que revende. Isto porque é o próprio art. 3º, da Lei n. 10.833⁄2003, que dá expressamente o direito ao creditamento para a pessoa jurídica pelos bens utilizados como insumo na prestação de serviços, incluindo no conceito desses bens os combustíveis e lubrificantes. Transcrevo novamente com os grifos necessários:
Art. 3o Do valor apurado na forma do art. 2o a pessoa jurídica poderá descontar créditos calculados em relação a:      (Produção de efeito)        (Vide Medida Provisória nº 497, de 2010)   (Regulamento)
[...]
II - bens e serviços, utilizados como insumo na prestação de serviços e na produção ou fabricação de bens ou produtos destinados à venda, inclusive combustíveis e lubrificantes, exceto em relação ao pagamento de que trata o art. 2o da Lei no 10.485, de 3 de julho de 2002, devido pelo fabricante ou importador, ao concessionário, pela intermediação ou entrega dos veículos classificados nas posições 87.03 e 87.04 da Tipi; (Redação dada pela Lei nº 10.865, de 2004)
[...]
Em outras palavras, caracterizada a prestação de serviços de transporte, ainda que associada à venda de suas próprias mercadorias há de ser reconhecido o direito ao creditamento pelo valor pago na aquisição das peças, combustíveis e lubrificantes necessários a esse serviço, posto que insumos. E aqui, mais uma vez com as devidas vênias, pondero que o que vincula o julgador não é a causa de pedir, mas o pedido feito na inicial ("Jura novit curia"), razão pela qual o argumento de se tratar de insumo aplicado na atividade de prestação de serviços deve ser analisado consoante os fatos incontroversos fixados nos autos ("Da mihi factum, dabo tibi jus").
A inserção dentro do objeto social da empresa da atividade de transporte rodoviário de cargas em geral é fato incontroverso contra o qual não houve qualquer impugnação por parte da FAZENDA NACIONAL. Outro fato incontroverso é o de que o valor do transporte da mercadoria vendida está embutido no preço de venda (faturamento), como custo que é da empresa, ingressando assim na base de cálculo das contribuições ao PIS⁄COFINS (receita bruta). Com custo do transporte e o correspondente aumento do preço de venda há evidente agregação de valor, pressuposto da tributação e também da aplicação da não-cumulatividade. O registro foi feito na sentença, pelo Juiz de Primeiro Grau (...):
Nesse contexto, o reconhecimento do direito da impetrante ao desconto pretendido decorre da aplicação direta da interpretação da própria Secretaria da Receita do conceito de insumo. A requerente distribui as mercadorias por ela vendidas com frota própria de veículos. Com isso, a distribuição também é objeto de sua atividade empresarial. Tanto é assim que o contrato social prevê o "transporte rodoviário de cargas em geral" como parte do objeto social (...).
A entrega rodoviária é um serviço prestado pela impetrante, agregado à venda em si das mercadorias.
Os combustíveis, lubrificantes e peças de reposição utilizadas pelos veículos da impetrante na atividade de distribuição são indubitavelmente "bens aplicados ou consumidos" na prestação do serviço, que não estão "incluídos no ativo imobilizado" (Instruções Normativas transcritas, inciso II, a). A agregação física dos insumos, como já afirmado, não é requerida.
Aliás, as discussões propostas no sentido de que os combustíveis e lubrificantes não poderiam ser considerados insumos porque não se agregam a qualquer produto durante o processo produtivo ou de que a prestação de serviços de transportes se daria por parte da empresa para si mesma me parecem de todo inadequadas. Primeiro porque não se pode exigir creditamento físico de empresas que atuam no setor de serviços, já que não fabricam nada. Segundo porque a discussão sobre quem presta o serviço de transportes para quem é inócua, pois, além de depender do que dispõe o contrato de compra e venda (se está incluso ou não o preço do transporte - art. 490, CC⁄2002), no campo econômico o transporte sempre representa custo (econômico) para a empresa transportadora que ela repassa implícita ou explicitamente no preço final que cobra de seus clientes, destacado ou não na fatura. Não por outro motivo que o frete na operação de venda quando o ônus for suportado pelo vendedor foi considerado custo apto a gerar créditos de PIS⁄COFINS não-cumulativas, in verbis:
Art. 3o Do valor apurado na forma do art. 2o a pessoa jurídica poderá descontar créditos calculados em relação a:      (Produção de efeito)        (Vide Medida Provisória nº 497, de 2010)   (Regulamento)
[...]
IX - armazenagem de mercadoria e frete na operação de venda, nos casos dos incisos I e II, quando o ônus for suportado pelo vendedor.
[...]
Decerto, houvesse cláusula contratual definindo que as despesas da tradição (frete) estariam a cargo do comprador, juridicamente haveria clara prestação de serviços de transportes por parte da vendedora. No entanto, economicamente, tal é indiferente para a composição do custo e do valor agregado, que é o que nos interessa na tributação não-cumulativa.
Com efeito, a vedação do creditamento em casos como o presente teria por únicos efeitos (a) forçar a empresa vendedora⁄transportadora a registrar em cláusula contratual que as despesas da tradição (frete) estariam a cargo do comprador, fornecendo a ele o serviço, ou (b) terceirizar a atividade de transporte de suas mercadorias para uma outra empresa que possivelmente seria criada dentro de um mesmo grupo econômico apenas para se fazer planejamento tributário, com renovados custos burocráticos (custos de conformidade à legislação tributária, empresarial e trabalhista para a criação de uma nova empresa). Não vislumbro qualquer ganho social, econômico e de tributação aparente nessas duas iniciativas que as tornem melhores e mais desejáveis que a atual situação da empresa nos autos.
Para concluir, registro que o presente caso é inédito, pois em tudo difere do julgado no AgRg no REsp 1335014 ⁄ CE (Segunda Turma, Rel. Min. Castro Meira, julgado em 18.12.2012) e no REsp 1147902 ⁄ RS (Segunda Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 18.03.2010), onde enfrentado o creditamento de PIS⁄COFINS pelas despesas de frete entre estabelecimentos de uma mesma empresa, e do REsp 1215773 ⁄ RS (Primeira Seção, Rel. Min. Benedito Gonçalves, Rel. p⁄acórdão Min. César Asfor Rocha, julgado em 22.08.2012), onde se discutiu o creditamento quando, na operação de venda ao consumidor final, o frete incide no transporte do veículo da fábrica para a concessionária a fim de ser entregue ao consumidor final.
Dessa forma, considero que todos os pressupostos para o creditamento estão presentes: trata-se de combustíveis, lubrificantes e peças utilizados na prestação de serviços de transportes, serviços estes componentes do objeto social da empresa e cujo custo é transferido para o elo subsequente na cadeia econômica e cujo faturamento sofre a tributação pelas contribuições ao PIS e COFINS não-cumulativas.
Ante o exposto, COM AS VÊNIAS DE PRAXE, DIVIRJO DO RELATOR PARA DAR PROVIMENTO ao recurso especial.


Por derradeiro o Ministro Humberto Martins, também se posiciona nos mesmos parâmetros do voto-vogal do Ministro Cesar Asfor Rocha  nos termos parcialmente transcritos:

“Recurso especial proveniente de ação mandamental, na qual se pleiteia o aproveitamento como crédito dedutível da base de cálculo do PIS e da COFINS, nas despesas e custos inerentes à aquisição de combustíveis, lubrificantes e peças de reposição utilizados em veículos que realizam a entrega de suas mercadorias.

O Tribunal Regional Federal da 4ª Região deu provimento à apelação interposta pela UNIÃO reconhecendo a impossibilidade do alargamento do conceito de insumos.

Para o acórdão recorrido "as leis que instituíram o PIS e a COFINS não cumulativos apenas autorizam a apropriação de créditos calculados era relação a bens e serviços utilizados como "insumos" na fabricação de produtos destinados à venda, sem explicitar qual o alcance desse termo. Contudo, isso não significa que se possa caracterizar como insumo todos os elementos, inclusive os indiretos, necessários à produção de produtos e serviços, como mão de obra energia elétrica."

Nesse contexto, deve ser entendido por insumo "cada um dos elementos imprescindíveis para a produção de mercadorias ou para a prestação de serviços, desde que intrínsecos à atividade das empresas". Daí porque não podem ser considerados insumos os gastos ou despensas com combustíveis, lubrificantes e peças de reposição de veículos utilizados para o transporte de mercadorias vendidas pela empresa.

“Mantenho o entendimento adotado no julgamento do REsp 1.246.317⁄MG”.

“A Lei n. 10.833, de 2003, teve por escopo transformar o PIS e a COFINS em tributos não cumulativos; para tanto, alterou a hipótese de incidência tributária, permitido que o contribuinte exclua da contribuição devida os créditos, entre outros, referentes à energia elétrica ou térmica, aluguéis de prédios, máquinas e edificações utilizados nas atividades da empresa, nos termos do que estabelece o art. 3º, verbis:

"Art. 3º Do valor apurado na forma do art. 2º a pessoa jurídica poderá descontar créditos calculados em relação a:
I - bens adquiridos para revenda, exceto em relação às mercadorias e aos produtos referidos: (Redação dada pela Lei nº 10.865, de 2004)
a) no inciso III do § 3º do art. 1º desta Lei; e (Redação dada pela Lei nº 11.727, de 23 de junho de 2008)
b) no § 1º do art. 2º desta Lei; (Incluído pela Lei nº 10.865, de 2004)
b) nos §§ 1º e 1º-A do art. 2º desta Lei; (Redação dada pela Lei nº 11.787, de 25 de setembro de 2008)
II - bens e serviços, utilizados como insumo na prestação de serviços e na produção ou fabricação de bens ou produtos destinados à venda, inclusive combustíveis e lubrificantes, exceto em relação ao pagamento de que trata o art. 2º da Lei n. 10.485, de 3 de julho de 2002, devido pelo fabricante ou importador, ao concessionário, pela intermediação ou entrega dos veículos classificados nas posições 87.03 e 87.04 da TIPI; (Redação dada pela Lei nº 10.865, de 2004)
III - energia elétrica e energia térmica, inclusive sob a forma de vapor, consumidas nos estabelecimentos da pessoa jurídica; (Redação dada pela Lei nº 11.488, de 15 de junho de 2007)
IV - aluguéis de prédios, máquinas e equipamentos, pagos a pessoa jurídica, utilizados nas atividades da empresa;
V - valor das contraprestações de operações de arrendamento mercantil de pessoa jurídica, exceto de optante pelo Sistema Integrado de Pagamento de Impostos e Contribuições das Microempresas e das Empresas de Pequeno Porte - SIMPLES; (Redação dada pela Lei nº 10.865, de 2004);
VI - máquinas, equipamentos e outros bens incorporados ao ativo imobilizado, adquiridos ou fabricados para locação a terceiros, ou para utilização na produção de bens destinados à venda ou na prestação de serviços; (Redação dada pela Lei nº 11.196, de 2005)
VII - edificações e benfeitorias em imóveis próprios ou de terceiros, utilizados nas atividades da empresa;
VIII - bens recebidos em devolução cuja receita de venda tenha integrado faturamento do mês ou de mês anterior, e tributada conforme o disposto nesta Lei;
IX - armazenagem de mercadoria e frete na operação de venda, nos casos dos incisos I e II, quando o ônus for suportado pelo vendedor.
X - vale-transporte, vale-refeição ou vale-alimentação, fardamento ou uniforme fornecidos aos empregados por pessoa jurídica que explore as atividades de prestação de serviços de limpeza, conservação e manutenção. (Incluído pela Lei nº 11.198, de 8 de janeiro de 2009)
(...)
§ 10. O valor dos créditos apurados de acordo com este artigo não constitui receita bruta da pessoa jurídica, servindo somente para dedução do valor devido da contribuição." (Grifo meu).

“O regime não cumulativo das contribuições utiliza técnica distinta da aplicada ao IPI e ao ICMS, porquanto, nestes tributos, a não cumulatividade representa crédito corresponde ao valor do imposto devido, pela entrada da mercadoria ou insumo no estabelecimento, que será compensado na saída da mercadoria. Por sua vez, a não cumulatividade do PIS e da COFINS trata-se de crédito a ser deduzido da contribuição devida, ou seja, possibilita a apropriação das contribuições incidentes sobre insumos utilizados no processo produtivo, as quais são deduzidas das contribuições a recolher”.

“No caso em tela, e conforme destacado pelo eminente Ministro César Asfor Rocha em seu voto divergente, é incontroverso o fato de que é do objeto social da empresa o transporte rodoviário de cargas; de modo que o pleito vinculado na presente demanda diz respeito apenas creditamento de PIS e COFINS sobre aquisições de combustíveis, lubrificantes e peças de reposição "utilizados nos veículos de entrega das mercadorias"”.

“Em meu sentir, no caso em exame, o conceito de insumo deve ser abranger as aquisições de combustíveis, lubrificante e peças de reposição, sob pena de criarmos um discrimen anti-isonômico; na medida em que a empresa transportadora pode creditar-se do PIS e da COFINS incidentes sobre os mencionados insumos. Assim, se empresa prestar o serviço de entrega não poderá beneficiar-se do referido crédito. Daí porque o simples fato de a empresa realizar - ela própria - o transporte não pode ser empecilho para o creditamento”.

“Não é razoável que não cumulatividade do PIS e a COFINS somente seja utilizada em situações em que a empresa contrate serviço de transporte de terceiros, sob pena de violação do art. 150, II, da CF⁄88”.

“Ante o exposto, com a devida vênia do eminente Ministro Relator, acompanho a divergência inaugurada pelo Ministro Cesar Asfor Rocha para dar provimento ao recurso especial”.

Importante salientar que a tese vencedora torna-se emblemática na medida em que é a primeira vez que o judiciário reconhece o direito ao crédito do PIS e da COFINS Não Cumulativos de combustíveis, lubrificantes e peças de reposição utilizadas no serviço de transporte próprio de mercadorias vendidas por comerciante atacadista; onde os custos dos serviços prestados encontram-se intrinsecamente agregados ao valor da venda.


Esperamos que a tese divergente do presente julgado torne-se  paradigma jurisprudencial aliviando a carga tributária insuportável a que os contribuintes estão sujeitos.

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