21/08/2012

IRPJ – CARF entende que Ágio Interno pode ser amortizado.


É o que se depreende do voto vendedor – conciso, mas substancioso - do Conselheiro Carlos Eduardo Almeida Guerreiro do CARF – Processo nº 10680724392/2010.8, R.V., Provido por Maioria de Voto, Acórdão nº 1101-00.708, 1ª Câmara/1ª Turma Ordinária, julg. 11.04.2012), que considerou legal a operação efetuada pela Gerdau ao proceder à compensação tributária do ágio na reestruturação societária entre empresas do mesmo grupo econômico (ágio interno), discordando da relatora Edeli Pereira Bessa.

Aduz Guerreiro em seu voto “Na sua essência, a situação que subjaz ao lançamento é a seguinte: 1º) a empresa "A", controladora de "B", subscreve e integraliza capital na empresa "C", utilizando ações de "B"; 2°) na integralização, as ações de "B" são recebidas por "C" por valor maior do que o valor patrimonial, sendo a diferença justificada por laudo de avaliação, em razão de expectativa de resultado futuro; 3°) com a integralização, a empresa "A" apura ganho de capital pela alienação do controle de "B" e a empresa "C" registra ágio pela aquisição a valor maior do que o valor patrimonial das ações que adquiriu; 4°) a empresa "B" (controlada) incorpora a empresa "C" (controladora) e passa a contabilizar a amortização do ágio”.

Segue em seu voto “No dizer da fiscalização "o registro contábil e a amortização desse ágio são indevidos, por se tratar de ágio gerado internamente, ou seja, dentro de um grupo de sociedades sob controle comum".” Diz, ainda, "se estivéssemos diante de verdadeiro ágio, os efeitos fiscais dessa amortização estariam amparados no art. 7° da Lei 9.532/97". Em contrapartida, a fiscalização diz que o ganho de "A" é artificial e sem suporte econômico. Por fim, afirma que, no caso concreto, a empresa "C" é uma empresa veiculo cuja característica é "sua breve existência, com o intuito único de transportar o ágio para torná-lo dedutível para fins fiscais".

“Em resumo, considerando a situação genérica descrita inicialmente, conforme a fiscalização, se a empresa "C" for do mesmo grupo que a empresa "A", não é admissível que "C" contabilize o ágio, por ser "ágio interno". Em decorrência, a amortização feita por "B" após a incorporação de "C" deve ser glosada”.

“Assim, sendo "ágio interno", a fiscalização entende que "a irregularidade é a utilização de um artifício contábil sem suporte econômico (registro de ágio interno), na tentativa de aplicar o tratamento previsto na legislação para o verdadeiro ágio".”

Os argumentos da fiscalização trazidos aos autos basearam-se nos ensinamentos de Jorge Vieira da Costa Júnior e Eliseu Martins ao afirmarem que "à luz da teoria da contabilidade é inadmissível o surgimento de ágio em uma operação realizada dentro de um mesmo grupo econômico", por não haver independência no processo negocial e não acarretar ingresso de novos recursos para o grupo”; constante do Manual de Contabilidade por Ações da FIPECAFI; do Novo manual de Contabilidade Societária da FIPECAFI; das normas da CVM de 2007, e pronunciamentos recentes do CPC que repudiam o reconhecimento do ágio interno; que em síntese traz “a operação não implica em ingresso de recursos, por não haver pagamento, de sorte que é artificial e não há substrato econômico para admitir o ágio; e finalmente que a instrução CVM n° 319 de 1999 admite a amortização do ágio, mas ela trata do "autêntico ágio", que ocorre quando há pagamento efetivo deste ágio”.

O insigne Conselheiro rebate tais argumentações sustentado que Porém, constata-se que a fiscalização, ao retratar a posição desses respeitáveis autores, registrou apenas parte do que eles defendem. Como se demonstra em seguida, ao contrário do que entendeu a fiscalização, os autores citados afirmam que, mesmo em caso de operações dentro do grupo, para fins fiscais, surge o ágio e ele pode ser amortizado pela empresa "B". Ou seja, esses especialistas reconhecem expressamente o ganho tributário da operação e a tratam como caso de elisão (planejamento tributário)”.

“Na verdade, as manifestações contrárias ao ágio interno que essas autoridades emitem se referem apenas ao aspecto contábil e não ao aspecto legal-tributário. Ou seja, Jorge Vieira da Costa Júnior e Eliseu Martins reconhecem expressamente o ganho tributário, mas não admitem que a contabilidade retrate o ágio nascido de operações entre as empresas do grupo”. (grifamos)

“O mesmo acontece em relação às transcrições da CVM e CPC. As normas da CVM e pronunciamentos do CPC estão preocupadas apenas com a questão contábil, não tendo (e nem poderia ter) qualquer efeito na questão tributária”.

Com as vênias de estilo, no caso concreto, a fiscalização cometeu erro crasso, visto não ter atentado para o art.109 do CTN que proíbe a utilização de princípios do direito privado para definir efeitos tributários.

Guerreiro, cita, ainda, com regra para a amortização do ágio o art. 385 do RIR1 1999, reprodução do art. 20 do Decreto-lei n 1.598, de 1997 e salienta que “Tanto faz que a aquisição decorra de uma compra, ou decorra da aceitação que a subscrição seja feita por entrega de quotas/ações, recebidas por valor acima do valor patrimonial. A aquisição é gênero, do qual a compra ou a troca, por exemplo, são espécies”.

Ao tratar do fundamento econômico, diz Guerreiro “... ele decorre das situações previstas no art. 20, § 22, Decreto-Lei n2 1.598, de 1977. É também um grave erro confundir fundamento econômico com pagamento. Também está equivocado limitar a existência de fundamento econômico às operações com terceiros estranhos ao grupo econômico.”; e conceitua-os com sendo: “Pagamento é a contrapartida da compra e venda uma das formas de aquisição da participação. Fundamento econômico do ágio é a razão de ser da mais valia sobre o valor patrimonial. O fato de a operação ser entre empresas do grupo não altera a mais valia das ações negociadas”.

Neste aspecto, aduz, ainda, que “De fato, apesar de a fiscalização alegar a inexistência de fundamento econômico, ela o faz se referindo ausência de pagamento por terceiros, já que a aquisição foi por meio de aceitação das ações/quotas da investida como integralização de capital entre empresas do mesmo grupo. Assim, o Fisco duvida do fundamento econômico, por confundir fundamento econômico com pagamento de terceiro estranho ao grupo, e não faz qualquer esforço para infirmar o laudo que é o instrumento legal que garante o fundamento econômico nos termos exigidos pela legislação fiscal”.(Grifamos)

Por fim, diz Guerreiro, “De qualquer modo, fica evidenciado os equívocos teóricos constante da autuação: 1º) limitar o conceito de aquisição ao de compra; 2°) confundir fundamento econômico do ágio com pagamento de compra ou entrega de ações, por terceiros estranhos ao grupo. Sem mencionar a pretensão de impor para fins fiscais percepções de cunho exclusivamente contábil”.

“Por meio desses enganos e da leitura incompleta de autoridades da Área Contábil, a fiscalização criou uma falsa distinção entre um ágio autêntico, que desfruta do amparo dos arts. e 8º da lei na 9.532, de 1997, e um ágio artificial, que deixaria de ser alcançado pelos dispositivos citados. Mas, como se vê essa distinção não existe para fins fiscais, nem é admitida pela legislação, e sequer é aceita pelos autores citados no que tange à tributação”.

Carlos Eduardo Almeida Guerreiro para dar mais robustez ao arcabouço jurídico de seu voto traz, ainda, alguns esclarecimentos cujos títulos são os seguintes: DIREITO TRIBUTÁRIO. ABUSO DE DIREITO. LANÇAMENTO; PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO. ELISÃO. EVASÃO.; ELISÃO.; SEGURANÇA JURÍDICA.

Digno de nota.
 
O CARF é composto por representantes conselheiros dos contribuintes e da Receita Federal. Guerreiro representa o fisco. Mas nem por isso defende arbitrariedades ou desmandos impostos pela fiscalização da Instituição que pertence. Afirma em seu voto “Não há base no sistema jurídico brasileiro para o fisco para afastar a incidência legal, sob a alegação de entender estar havendo abuso de direito”.

A seguir é reproduzida a Ementa do citado Acórdão:


ASSUNTO: IMPOSTO SOBRE A RENDA DE PESSOA JURÍDICA - IRPJ



Ano-calendário: 2005, 2006, 2007, 2008



ÁGIO. REQUISITOS DO ÁGIO.



O art. 20 do Decreto-Lei n° 1.598, de 1997, retratado no art. 385 do RIR11999, estabelece a definição de ágio e os requisitos do ágio, para fins fiscais. O ágio é a diferença entre o custo de aquisição do investimento e o valor patrimonial das ações adquiridas. Os requisitos são a aquisição de participação societária e o fundamento econômico do valor de aquisição.

Fundamento econômico do ágio é a razão de ser da mais valia sobre o valor patrimonial. A legislação fiscal prevê as formas como este fundamento econômico pode ser expresso (valor de mercado, rentabilidade futura, e outras razões) e como deve ser determinado e documentado.



ÁGIO INTERNO.



A circunstância de a operação ser praticada por empresas do mesmo grupo econômico não descaracteriza o ágio, cujos efeitos fiscais decorrem da legislação fiscal. A distinção entre ágio surgido em operação entre empresas do grupo (denominado de ágio interno) e aquele surgido em operações entre empresas sem vinculo, não é relevante para fins fiscais.



ÁGIO INTERNO. INCORPORAÇÃO REVERSA. AMORTIZAÇÃO.



Para fins fiscais, o ágio decorrente de operações com empresas do mesmo grupo (dito ágio interno), não difere em nada do ágio que surge em operações entre empresas sem vinculo. Ocorrendo a incorporação reversa, o ágio poderá ser amortizado nos termos previstos nos arts. 7° e 8° da Lei n° 9.532, de 1997.



ASSUNTO: NORMAS GERAIS DE DIREITO TRIBUTÁRIO



Ano-calendário: 2005, 2006, 2007, 2008



ART. 109 CTN. ÁGIO. ÁGIO INTERNO.



É a legislação tributária que define os efeitos fiscais. As distinções de natureza contábil (feitas apenas para fins contábeis) não produzem efeitos fiscais. O fato de não ser considerada adequada à contabilização de ágio, surgido em operação com empresas do mesmo grupo, não afeta o registro do ágio para fins fiscais.



DIREITO TRIBUTÁRIO. ABUSO DE DIREITO. LANÇAMENTO.



Não há base no sistema jurídico brasileiro para o Fisco afastar a incidência legal, sob a alegação de entender estar havendo abuso de direito. O conceito de abuso de direito é louvável e aplicado pela Justiça para solução de alguns litígios. Não existe previsão de o Fisco utilizar tal conceito para efetuar lançamentos de oficio, ao menos até os dias atuais. O lançamento é vinculado à lei, que não pode ser afastada sob alegações subjetivas de abuso de direito.



PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO. ELISÃO. EVASÃO.



Em direito tributário não existe o menor problema em a pessoa agir para reduzir sua carga tributária, desde que atue por meios lícitos (elisão). A grande infração em tributação é agir intencionalmente para esconder do credor os fatos tributáveis (sonegação).



ELISÃO.



Desde que o contribuinte atue conforme a lei, ele pode fazer seu planejamento tributário para reduzir sua carga tributária. O fato de sua conduta ser intencional (artificial), não traz qualquer vicio. Estranho seria supor que as pessoas só pudessem buscar economia tributária lícita se agissem de modo casual, ou que o efeito tributário fosse acidental.



SEGURANÇA JURÍDICA.



A previsibilidade da tributação é um dos seus aspectos fundamentais.

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